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De 21 de Outubro a 03 de Novembro
Por Cristiane Costa, Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação
Os diferentes povos e culturas têm seus rituais em torno da morte e essa diversidade nas cidades faz parte de um contínuo e potencial mercado funerário, dependendo da estratégia das empresas do setor. Isso implica que, para morrer há um custo planejado ou posterior às famílias e responsáveis, ainda que menor conforme a escolha do ritual fúnebre, local e valores. A realidade é que, para viver o cidadão leva uma jornada inteira pagando boletos e impostos e, na despedida, para ter o mínimo de dignidade e honras, há os custos com jazigo, rituais e manutenção.
Lidando com a Morte (Dealing with death, 2020), documentário Holandês dirigido por Paul Rigter, busca mostrar os bastidores de uma empresa que tem como projeto ser um grande centro funerário multicultural em Bijlmer, Amsterdã. A gerente de funeral, Anita, tem uma função semelhante à uma gerência de conta na qual, além de compreender os variados rituais das múltiplas comunidades étnicas da cidade, participa de reuniões com executivos e populações de interesse assim como visita templos e líderes religiosos.
Simpática, informal e focada no negócio, Anita circula na sociedade inicialmente acreditando no projeto e atenta aos feedbacks das comunidades e líderes, mas também na vida pessoal vivencia a proximidade da morte ao aparecer ao lado do pai doente. À medida que o roteiro avança, Anita demonstra maior desânimo, compreendendo e questionando até que ponto as distintas culturas precisam de um centro funerário. Ainda que seja uma mulher madura que não teve tanto protagonismo no doc. por causa de uma lacuna da direção, é possível notar que ela teria muito mais a acrescentar se não tivesse seguindo os objetivos de negócio de um ambicioso projeto.
O trabalho de Paul Rigter é válido como uma realidade do mercado funerário sobre o qual nem todas as pessoas discutem a respeito devido aos tabus acerca da morte e se esquecem de que, fazer as honras a um ente querido morto, exige planejamento, investimentos e algumas burocracias. As culturais indígenas, afro americanas e orientais são mais abertas a discutir sobre as fronteiras entre a vida e a morte e os rituais espirituais. Já o Ocidente tende a valorizar mais a cultura do consumo e da vida de status, prestígio e aparência. O documento agrega em propiciar ao espectador observar a dinâmica do mercado funerário sob as perspectivas multicultural e empresarial.
Como gênero documental, o longa deixa a desejar em aspectos que poderiam ter sido melhor desenvolvidos, principalmente no trabalho de pesquisa e na direção. Em determinadas obras em doc., o(a) documentarista é levado(a) a conduzir as cenas com muita liberdade e pensa que apenas posicionar a câmera na mão ou em determinado ângulo, como uma testemunha e um(a) observador(a), é suficiente. Esse vício leva ao equívoco de que qualquer um pode realizar um documentário. O intenso trabalho de pesquisa e planejamento que um doc. exige nunca deve ser subestimado.
Por certo, um documentário de qualidade exige uma preparação intensa de pesquisa e roteirização mesmo que queira entregar o protagonismo às pessoas e à realidade dos fatos. É sabido que nem todos os documentaristas têm vocação e habilidades para entrevistar e/ou conduzir uma direção eficiente que dê voz aos envolvidos e que ajude a moldar uma atrativa e funcional obra não-ficcional com algo relevante a dizer.
Nesse documentário escapa a naturalidade e riqueza dos povos e rituais multiculturais assim como não seleciona muito bem as pessoas que poderiam agregar melhores informações e experiências sobre este contexto. O documentarista ainda se mantem em uma posição passiva para a potência do tema e perde boas oportunidades na investigação e no desenvolvimento. Nesse sentido, o próprio business e a ambição dos executivos do mercado funerário ficam muito mais evidentes, chegando ao ponto do longa inclinar-se à uma narrativa institucional que se ocupa em "vender" o negócio, assim, deixando os vivos e os mortos em segundo plano.
Em um mundo que visa o lucro pelo lucro com "boas intenções" corporativas, ver os executivos rindo à toa não traz nenhuma surpresa, nem na vida e nem na morte.
Fotos, uma cortesia divulgação Mostra SP.
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