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  #SCIFi #Romance #Drama #Memória #Tempo Por  Cristiane Costa ,  Editora e blogueira crítica de Cinema, e specialista em Comunicação A relaç...

Caminhos da Memória (Reminiscence, 2021)

 






#SCIFi #Romance #Drama #Memória #Tempo


Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação



A relação que o ser humano tem com o passado transita entre a possibilidade de reviver as boas memórias e experiências como também enfrentar gatilhos que as más lembranças trazem. É uma relação de aproximação e rechaço. Neste sentido, memória é lugar de resgate e de enfrentamento. Não lembrar de algo doloroso traz certo alívio, porém, as memórias ainda são importantes e fazem parte de histórias que podem ser revividas ou escritas de uma forma diferente com desfechos mais otimistas.










Caminhos da memória (Reminiscence,2021), recente sci-fi de Lisa Joy combina romance, drama e ficção em um Miami futurista e enigmática. A história flerta com o film noir, o suspense e a violência ao apresentar Mae, uma mulher misteriosa e sedutora interpretada por Rebecca Ferguson, que se aproxima do ex-combatente de guerra Nick Bannister (Hugh Jackman). Após se conhecerem no local onde Nick e Emily (Thandiwe Newton) atendem clientes que desejam recuperar as memórias, eles se envolvem afetivamente de forma apaixonada e intensa. Tudo indicava que era um relacionamento potente, porém, após o desaparecimento de Mae, Nick faz de tudo para descobrir seu paradeiro.






Muito do estilo dessa história tem relação com a identidade e família de Lisa Joy. Ela é casada com Jonathan Nolan, produtor, diretor e roteirista da série Westworld e produtor desse filme, além de ser cunhada do cineasta Christopher Nolan. O filme é ambientado em um espaço que poderia ser um local criado no sonho de um indivíduo ou em um mundo paralelo, assim a cineasta, em seu primeiro longa-metragem, se aproxima das influências dos Nolans. Em variados momentos, o estranhamento é natural na experiência com a história, trazendo à memória tanto a relação afetiva presente em A origem (Inception, 2010) como também o clima de mistério de Westworld. Apesar dessas reminiscências com outras obras da família, Lisa Joy consegue se arriscar razoavelmente, o que já representa um bom começo.








A cidade obscura está alagada e decadente como em uma distopia. Ela recebe uma releitura futurista a partir de elementos do Cinema  Noir, dominada por homens violentos, protagonizada por uma mulher cujo caráter é colocado em dúvida e por um homem apaixonado que foi (ou não) usado por essa mulher. Essa Miami sci-fi é um lugar diferente do plano da realidade, por mais que os eventos pareçam reais e algumas interações romantizadas. Assim, o roteiro e a montagem cooperam entre si para uma experiência mais emotiva do que propriamente intelectual.



É interessante notar que aqui se confirma algo que já se viu nos filmes de Christopher Nolan:  Na essência, os Nolans são românticos! Eles adoram romantizar a relação de personagens e Lisa não deixou esse elemento sedutor para trás; desta forma, a relação entre Mae e Nick se baseia mais na tensão desaparecimento x busca, ausência x presença. Nick se apaixona perdidamente e a falta da mulher amada o faz buscá-la a partir da própria tecnologia que ele criou. Usa a máquina de recuperar memórias para desvendar o mistério e, como consequência, entra em conexão com as lembranças dessa mulher marcante e inesquecível.







Não há como negar que uma peça essencial na experiência com a história é Hugh Jackman e sua alta capacidade de expressar carisma e cativar admiração, ainda mais como um homem apaixonado em busca de um amor. O roteiro não precisa ser excepcional e muito menos a direção, mas se há um ator como o eterno Wolverine em ação, com certeza, o projeto tem mais chance de despertar a curiosidade e atrair o público. É exatamente o bem visto no lançamento. Nick atua como um detetive anônimo em um mundo desperançoso e cínico, mais uma vez realizando referência ao drama noir. Nick foi amado ou enganado por Mae? Essa dinâmica narrativa previsível no gênero é contínua, entretanto, não é marcada com ênfase no antagonista ou em uma tensão entre as partes rivais. Importa muito mais na história mostrar um fio de esperança desse homem apaixonado em busca da verdade.




Caminhos da memória inclina-se mais a um drama noir romântico combinado a uma discreta ficção científica do que um filme noir violento com um ágil jogo cênico de reviravoltas e suspense. Por conta dessa característica, talvez não agrade a todos. Por outro lado, a decisão de Lisa Joy de colocar um pouco da sua identidade e experiência familiar no longa é funcional e prática. De certa forma, ela não enganou a si mesma e manteve uma lógica baseada em seu estilo de trabalhar com o marido. Além disso, como se trata do primeiro filme, potencialmente ela tem condições de impressionar o público mais adiante ou, no mínimo, ser mais uma cineasta apaixonada por sci fi que trará experimentos nesta seara.



Entre as oportunidades perdidas por Lisa Joy estão o superficial desenvolvimento das camadas narrativas que envolvem outros personagens, deixando boa parte do longa nas costas de Hugh Jackman, a tímida direção do elenco e insuficiente tomada de riscos na decupagem. Ela mantem a execução fluída mais por um mérito da montagem do que propriamente da direção. A simplicidade do longa resulta de sua pouca experiência e expertise para uma proposta audaciosa.  Essa tentativa de trabalhar com gêneros muito potentes como o sci fi e o noir foi corajosa, mas a cineasta ainda precisa se conhecer e dominar esses gêneros para não cair no lugar comum. 



No mais, a forte influência da relação com o marido ainda não mostra se ela tem um estilo só dela no Cinema. A partir da segunda obra em longa, seguramente será possível identificar se ela fará a diferença em tela grande. Inclusive, um dos aspectos curiosos neste filme está relacionado ao fato de apresentar uma perspectiva masculina e não feminina. Nos últimos cinco anos, o Cinema feito por mulheres têm oportunizado trazer os olhares femininos, explorando a questão do gênero e desconstruindo uma tradição patriarcal nas contemporâneas produções culturais. Lisa Joy opta por não explorar a perspectiva feminina, embora conceda à personagem Mae um dos trechos mais comoventes da história (texto que, por sinal, se volta para o homem amado e, logo, remete a dar relevância ao homem).








O longa é um entretenimento leve cujo chamariz é Hugh Jackman, seguido de uma história de amor que pode ou não ter um final feliz, dependendo da perspectiva do que é presente e passado  e das escolhas de seguir em frente ou reviver as memórias continuamente. De todo modo, assim como Nick, cabe a cada um tomar uma decisão sobre o que deseja reviver. Para muitos, talvez o passado não seja uma prisão. Para outros, com os aprendizados, focar no presente e projetar o futuro seja a real liberdade.





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