Carlos Saura é o cineasta Espanhol mundialmente renomado por expressar sua póetica e metalinguística direção ao filmar grandes películas com a esplêndida Cultura Espanhola, principalmente enfocando a Dança e a Arte Flamenca. Dele são belos filmes flamencos como Bodas de Sangue, Carmen, El Amor Brujo, Ibéria e Flamenco, nos quais as estrelas da Tela Grande são famosos bailarinos e músicos do Flamenco como Manolo Sanlucar, Paco de Lucía, José Mercé, Manuela Carrasco, Antonio Gades, Cristina Hoyos, Sara Barras, Eva Yerbabuena, entre outros. Pode-se claramente afirmar que Carlos Saura é o cineasta do Flamenco, orgulho cinematográfico para aqueles que amam essa apaixonante Arte. Ele é um dos realizadores que mais expressam o seu amor ao seu país, um poeta da câmera que expressa sua ode à inimitável força do duende, a verdadeira paixão Flamenca.
Ele é um voyeur Flamenco e uma alma sensível que une nos planos e sequências de seus filmes, uma miscelânea de diálogos metalinguísticos entre as mais variadas manifestações artísticas. Ele abraça a Pintura, a Literatura, a Dança, a Música, a Fotografia e o Cinema em seus filmes e, com um olhar poético e magnificamente estético, sua câmera viaja pelas expressões e emoções de verdadeiros artistas Flamencos. Desde seu premiado Carmen (1983), inspirado na trágica ópera de Bizet, o cineasta sabe como deixar aflorar o encontro das Artes e a paixão Flamenca que emana diante de tanta beleza. Na premiada película com o BAFTA de melhor filme estrangeiro, Antonio Gades, um das lendas do Flamenco, se apaixona devastadoramente por Laura Del Sol em um passional e dançante jogo dos amantes movido a um insano ciúmes, ao som da magistral guitarra do mestre Paco de Lucía, o espetáculo é flamejante. Com Salomé (2002), outra tragédia, Carlos Saura conduziu uma direção de Arte e elenco arrebatadores que expressaram divinamente o jogo de paixão, ciúmes e vingança da história. Doze anos após Carmen, Carlos Saura lançou Flamenco, uma homenagem de maestria à Dança e Música Flamenca, no qual a câmera é conduzida entre belos cenários e apresentações das estrelas do Flamenco, exaltando a beleza artística de cada músico, cantor e bailarino, evocando o DNA Flamenco de grandes nomes como Joaquín Cortés, Maria Pagés, Enrique Morente, Jose Merce, etc.
Rocío Molina
Após 15 anos do lançamento do primeiro longa Flamenco (1995), muita coisa mudou na cena Flamenca. Embora a base da Dança e da Música se mantenha dentro da estrutura única e criativa da Arte, como o uso de palmas e batidas dos tacones (saltos dos sapatos), em harmonia sonora com os palos Flamencos (Ritmos variados como Bulerías, Soleá por Bulérias, Alegrias, etc) e a expressividade e sonoridade do Cante (o canto Flamenco), o Flamenco é uma Arte em crescente evolução e internacionalização. Atualmente, há do Flamenco Tradicional às Fusões com o Clássico, com o Pop, o Jazz, Soul, o Latino e com o World Music, passando por manifestações de artistas que mesclam outras linguagens como a do Teatro e a da Literatura. O Flamenco é essa inexplicável criadora força individual de sentir e expressar o Flamenco, mas acima de tudo, ela é conciliadora através do exímio talento desses artistas, capazes de expressarem emoções em um nível profundo de coletividade. Tendo essa premissa como material de trabalho e com a intenção de evocar o Flamenco contemporâneo aos mais jovens e às pessoas que ainda não o conhecem, Carlos Saura lança Flamenco, Flamenco, uma nova película que segue os moldes do de 1995, ou seja, um retorno à jornada de sublimes apresentações de dança em cenários deslumbrantes, montados com grandes painéis de fundo, com jogo de luzes, que mudam como estações de ano e estados de espírito, com o deslumbre da primorosa fotografia de Vittorio Storaro, um dos mais leais parceiros de Cinema de Carlos Saura, e a metalinguagem Sauraniana em momentos únicos como a do cantaor Miguel Poveda, que canta em um círculo formado por outros 2 homens que o acompanham sonoramente com batidas flamencas sobre uma mesa, enquanto que cartazes vintage da flamencologia os cercam.
Sara Baras
O cineasta uniu a nata do Flamenco atual, artistas de grande notoriedade técnica e estilos diferenciados que ganharam prestígio internacional como os bailarinos Sara Baras, Israel Gálvan, La Carpeta, Eva Yerbabuena, os cantores Miguel Poveda, Arcángel, Niña Pastori, Estrella Morente. Por outro lado, uniu também a velha guarda do Flamenco como os guitarristas Tomatito, Paco de Lucía, Manolo Sanlúcar, os cantores Jose Mercé e o bailaor Farruquito, entre outros. Sob o prisma do Cinema, Flamenco, Flamenco é muito mais do que um mero documentário sobre uma Arte do berço Andaluz, ele é pura linguagem cinematográfica universal, a de várias Artes que causam emoção e fascinação. Gravado em um set montado no pavilhão de Sevilha, logo no início, a câmera se aproxima e passeia por entre pinturas Flamencas, das mais clássicas a desenhos de mulheres bailaoras, a atmosfera é de bom gosto, já provoca uma emoção por adentrar esse universo rítmico no qual artistas de estilos e experiências tão diferentes tem o Flamenco como a paixão que os une. Há uma diversidade de atuações como a de Sara Baras, uma bailarina de porte mais clássico em uma apresentação de perfeição técnica, a de Eva Yerbabuena, a diva maestra do Flamenco em uma apresentação que absorve toda a dor emotiva da dança, expressa em sua face e no detalhismo de sentir o Flamenco por todo o seu corpo; a performática exibição de Israel Galván, um dos mais contemporâneos bailaores, de expressão diferenciada ao dançar sem trilha musical, somente a sonoridade de seus gestos de incrível criatividade em "Silêncio", a de Rocío Molina, com seu estilo sensualmente irreverente fumando um cigarro a cada tacón. Na vertente mais tradicional, em uma das cenas, a beleza da união da Família Flamenca, um clima gitano como em uma roda de diversas gerações, com a garota mais jovem, as senhoras de terceira idade e homens que cantam, dançam e exultam o Flamenco atemporal.
Miguel Poveda com Eva Yerbabuena e Israel Galvan
Em todos eles, não há uma história qualquer e sim a História do Flamenco, o como ele se faz história em cada indíviduo durante a projeção e que alcança o coletivo, o internacional, expresso através do enquadramento realizado da cena final, fora do estúdio. A forma como o cineasta atua é com o voyeurismo de uma câmera documental que não escapa às referências de seus trabalhos anteriores, mas ainda assim, há a poesia de cada película, de cada dança, de cada voz, de cada gesto, criando um clima lúdico de viajar por uma Espanha que se faz presente ali; um clima intimista e contemplativo, também igualmente sublime ao expressar a universalidade do Flamenco.
4 estrelas
Direção e roteiro de Carlos Saura/ Fotografia de Vittorio Storaro
3 comentários:
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Cristiane Costa, MaDame Lumière