Mostra SP 2020 - 22 de Outubro a 04 de Novembro
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Viva à permanência da Mostra SP em 2020!
Por Cristiane Costa, Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação
Um dos títulos criativos presentes na 44ª edição da Mostra SP é a animação Polonesa, Mate-o e saia desta cidade (Kill it and leave this town, 2020), com roteiro e direção Mariusz Wilczynski. Baseado em sua história de vida, memórias de infância, juventude, família e luto, o cineasta e professor de animação da Escola de Cinema de Lodz, realiza sua primeira animação em longa - metragem com enfoque bem adulto e denso, de complexa e difícil apreensão e com apelo perturbador. O animador levou 11 anos para finalizar esse trabalho.
Vencedora do Prêmio Especial do Júri do consagrado Festival de Annecy e exibido no Festival de Berlim, essa animação destaca-se pela sua diferenciada composição criativa articulada com uma profunda densidade de "fluxo de consciência", partindo de um universo bem particular do cineasta e ativando memórias, dramas, emoções e associações com pessoas, espaços, tempos, sons e imaginação. Através de sketches, ora melhor delineados, ora mais fluídos e inacabados, e outras técnicas híbridas de animação em stop motion, o cineasta narra o seu mundo intimista e o expande com intensa carga emocional, memórias difusas e fragmentadas e experiências com solidão, morte, sexo, amor e violência.
Não é uma animação fácil para se conectar porque está relacionada a um mundo bem privado, expresso de forma grotesca em como ela flui imageticamente. É comum alguns planos com cenas de nudez, cortes e costuras no corpo e sangue. Em outros recortes narrativos, a existência humana é de dolorosa contemplação como o choro de uma criança, a enfermidade de um idoso no hospital ou seu envelhecimento e cansaço, uma mãe com voz desesperada à procura de seu filho. Não chega a ser uma composição que choca ao extremo, mas é normal sentir-se desconfortável à medida que algumas associações não fazem tanto sentido ou são de difícil conexão, assim, mais incógnitas vão surgindo a respeito da infância, juventude e relações familiares do cineasta.
Em determinados pontos da animação, o cineasta recorre a sequências mais tradicionais,e portanto, mais digeríveis e compreensíveis, como por exemplo: uma mãe doente conversando com o filho no hospital; pais comemorando o Natal ao lado de uma criança; ou um casal dançando em um navio. Na maior parte da projeção, a singular composição de imagens, memórias, experiências e emoções é o tipo de animação que tende a colocar o público em um lugar de observação e, não necessariamente, entendimento, conexão e/ou empatia. Se houvesse apenas um adjetivo para qualificá-la, esse seria perturbador.
Desse modo, por mais que um(a) espectador (a) goste de animações, seja criativo, com pensamento fora da caixa e esteja sensível a linguagens que expressem perdas, frustrações e inquietações atravessadas pela melancolia, solidão e inadequação, Mate-o e saia desta cidade é um universo muito pessoal do cineasta, imageticamente complexo sob a perspectiva de compreensão do que se trata todas aquelas imagens. É uma legítima animação "psicotrópica", uma viagem psíquica cheia de nuances biográficas, aparentemente mal resolvidas. Restará ao público realizar inferências e apreciar as técnicas de animação.
Não há como negar que o trabalho criativo de Mariusz Wilczynski é de uma impecável precisão e singularidade, mesmo articulando temas existenciais complexos e experiências dolorosas. Parte do exito desse longa, além da sua experiência como animador e professor de animação, está relacionado a dois aspectos principais frente ao que foi apresentado no longa: Arte e repertório artístico.
Primeiramente, o cineasta tem um estilo como animador bastante artístico, no sentido de Arte Contemporânea. Há uma clara aproximação híbrida entre sua animação e referências modernas como uso de preto e branco e cores como manchas ou sangue (influenciados por comic art e sketches), fragmentos, colagens, esboços e sobreposições de imagens, além de recursos como narração em storytelling e sua relação com a contação de memórias, construção de uma cidade distópica, obscura e fria, e aplicação de trilha de sonora produzida por Tadeusz Nalepa, ampliando sonoridade de guitarra elétrica e do pop Polonês. Com música de Nalepa e montagem de Jaroslaw Barzan, pode-se dizer que esse trio funcionou bem tecnicamente.
Por fim, o fato do cineasta ter ampla experiência em exposição em museus contemporâneos, possibilita inferir que ele é um artista completo, engajado nos procedimentos e técnicas artísticas, valorizado e reconhecido por esses espaços. Ele já apresentou seus trabalhos em MoMa, London National Gallery e Museu Nacional de Varsóvia, entre outros.
Fotos: cortesia via Reprodução Mostra SP via assessoria do evento.
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