Por Cristiane Costa
Um dos filmes Brasileiros mais expressivos em premiação durante o 43º Festival de Cinema de Gramado foi "O último Cine Drive-in", com direção de Iberê Carvalho, que assina o roteiro com Zepedro Gollo, e tem a produção associada de Othon Bastos, grande ator vencedor do Kikito de Cristal, prêmio concedido por sua extensa e valiosa contribuição no Cinema Brasileiro. Ganhador de 4 categorias: Prêmio da Crítica de Melhor longa metragem nacional, melhor ator para Breno Nina, Melhor atriz coadjuvante para Fernanda Rocha e melhor Direção de Arte para Maíra Carvalho, o filme estreia hoje (20 de Agosto) no circuito nacional e tem como principal virtude a sua genuína beleza em reunir o Amor pelo Cinema e pela Família. Ambos passam por desafios de sobrevivência nessa comovente história.
Breno Nina, Fernanda Rocha e Maíra Carvalho
recebem seus prêmios em Gramado
De um lado, o último Cine Drive-in de Brasília administrado por Almeida (Othon Bastos) está sob o risco de ser fechado. Com apenas dois funcionários, Paula (Fernanda Rocha ) e Zé (Chico Sant'anna), Almeida faz sacrifícios para manter um cinema que não atraí mais a população como na década de 70 e costuma ser mais vazio do que bem frequentado; do outro lado, Marlombrando (Breno Nina), o filho de Almeida, que tem mágoas e ressentimentos pelo pai e que viaja à Brasília para levar Fátima (Rita Assemany), sua mãe doente para um tratamento médico. O drama evolui com o reencontro entre o filho e o pai e as dificuldades de lidar com o agravamento da doença de Fátima e com a manutenção e funcionamento do Cine Drive-in.
A narrativa segue um approach interessante ao deixar espaços silenciosos para o público observar como Marlombrando reage com relação ao pai Almeida e com a doença da mãe. Há momentos que as relações entre os familiares não evoluem e os conflitos não são abertamente tratados, assim, esse roteiro não tem a intenção de pesar a mão no drama. Nenhum dos dois é pintado como vilão e não sabemos exatamente detalhes do que aconteceu no passado, apenas que é sobre uma separação familiar. O ator Breno Nina é mais exigido na atuação pois tem uma forte conexão afetiva com sua mãe e, no centro da história está uma enfermidade, além de ser um jovem operário com picos emocionais nas interações com o pai e a situação de enfrentamento dos problemas de saúde da mãe. Seu pouco interesse no Cine Drive-in e a clara evidência de que ele e Almeida não conseguem se comunicar são alguns traços dramáticos da relação . Não há intensas discussões, brigas, gritos e lágrimas e o roteiro é desenvolvido a partir das sutilezas.
Ser sutil com as ações e emoções dos personagens aqui é uma evolução para o Cinema Brasileiro considerando que os roteiristas e cineastas do país precisam cada vez mais realizar um Cinema capaz de se conectar com o público com situações reais do cotidiano e sem esmiuçar demasiadamente as cenas com palavras e fórmulas prontas. Não a toa que esse filme foi premiado em júris oficial e popular como no 18º Festival Internacional de Cine de Punta del Este e no 18º Cine las Americas International Film Festival. Ele facilita esse processo de empatia com o público e a crítica exatamente por deixar espaços em branco com leveza.
Tendo em vista essa forma de aproximação da história com o espectador, o filme carrega a simplicidade de expor que, em algum momento, pai e filho se unem em favor de um amor muito maior e, nisso entra a belíssima representação do Cinema. É exatamente o Cine Drive-in e o amor de um filho por uma mãe que nutrem a história com uma comoção que somente o Cinema é capaz de proporcionar de uma maneira tão bela. De certa forma, ao contemplar os esforços de Almeida para manter o Cine Drive-in, que é como sua própria família, não há como não lembrar da metalinguagem com filmes que valorizam a Sétima Arte como, por exemplo, Cinema Paradiso de Giuseppe Tornatore. O Cinema é um integrante da família, é o sonho que sustenta a realidade. Almeida é um daqueles solitários que, por trás de seu rosto envelhecido e amarrado, esconde um grande coração. Othon Bastos dá o tom exato para um homem que não se deixa vencer e deseja que as coisas deem certo.
Como nem tudo são flores, esse é um longa que cria expectativas, a partir de seu título, de que o Cine Drive-in será bastante enfocado como o principal componente da dinâmica conflitiva, de que sua história e os interesses políticos e econômicos em fechá-lo representariam uma considerável parte do roteiro. De fato, não é. Isso pode frustar alguns. O roteiro apenas pincela algumas situações das ameaças de demolição do Cinema, alguns recortes de registros documentais de sua nostálgica trajetória mas pouco fala sobre o Cine Drive-in, não incentiva um barulho com relação ao seu fechamento. Felizmente , ele ganha vida através da competente direção de Arte da Maíra Carvalho. Ela realiza um trabalho minucioso em criar um ambiente cinéfilo com cartazes de filmes e equipamentos de projeção e, combina com isso, a singela casa de Almeida, parte do Cinema. É de notável beleza perceber que a casa dele é o próprio Cinema, caminhando juntos, inseparáveis.
Para aproveitar ao máximo a experiência com esse sensível longa, cabe perceber que o foco é mais familiar, afetivo. Abrir os olhos e o coração para ele é recebê-lo de braços abertos como uma homenagem ao Cinema. Filme simples, mas eficiente para despertar a sensibilidade do público com relação à sua importância no cenário atual de produção audiovisual Brasileira. Com ele, podemos perceber a maravilhosa dimensão coletiva do Cinema, a de reunir pessoas em um tempo presente cheio de memórias da vida e alguma esperança em dias melhores nos quais não caiba somente a dor e a perda.
Ficha técnica do filme ImDB O último Cine Drive-in
Distribuição : Vitrine filmes
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