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"Não há no mundo nada tão brilhante e delicado. Você tem me absorvido" Reconhecida como uma diretora e roteirista que enfoca ...

Brilho de uma Paixão (Bright Star) - 2009

"Não há no mundo nada tão brilhante e delicado. Você tem me absorvido"
Reconhecida como uma diretora e roteirista que enfoca os dramas de costumes nos quais as mulheres são protagonistas, a Neozelandesa Jane Campion, cineasta de Brilho de uma paixão, foi um marco em Cannes ao ganhar a Palma de Ouro e, no Oscar, o prêmio de melhor argumentista por seu magnífico trabalho em O Piano (1993). Eram tempos aúreos para Campion não somente pela qualidade do longa-metragem em si e as estatuetas de Oscar para ela e as atrizes Holly Hunter e Anna Paquin, mas pelo pioneiro reconhecimento : Jane Campion foi a primeira mulher a receber o valioso 'Palm D'Or', repercutindo esplendidamente na mídia cinematográfica e na desbravadora história das mulheres do Cinema, assim como o recente reconhecimento de Kathryn Bigelow (de Guerra ao Terror), a primeira mulher a receber o Oscar de Melhor Direção (2010). Após o sucesso de Piano, Campion não conseguiu emplacar um grande trabalho, transformou-se em uma cineasta de uma obra-prima só, pelo menos, até provar o contrário.
"Quase desejo que fôssemos borboletas e vivéssemos somente três dias de Verão".
Com o lançamento do drama romântico do século XIX, Brilho de uma paixão, inspirado na história de amor entre o poeta John Keats (Ben Whishaw) e Fanny Brawne (Annie Cornish), Jane Campion explora poeticamente o amor que encanta os corações, e cuja plena realização é afetada pelo dinheiro, pela doença, pela morte, pelo preconceito, etc. Fanny Brawne é uma jovem que cria e costura seus figurinos, já demostra ser à frente de seu tempo com opinião formada e curiosidade em crescente evolução. Sua mãe aluga quartos para John Keats e seu melhor amigo, Brown (Paul Scheider) e, a partir deste cenário, Fanny e Keats se aproximam, ela se interessa por sua poesia, eles começam a amizade e o cortejo. Keats é um poeta que ainda não é reconhecido e é perseguido por uma aura de fracasso já que não tem dinheiro para propor um dote a Fanny e pedí-la em casamento. Pouco a pouco, Fanny se encanta por Keats e se torna sua musa inspiradora, tudo com discrição mas com o desejo da descoberta. Ambos trocam olhares, toques, palavras e gentilezas até alcançarem o clímax do envolvimento amoroso e, com ele, as dificuldades que surgem ainda mais, provando que o amor é uma das (im)possibilidades da vida.
"Boa noite"
O roteiro de Jane Campion segue a base do gênero de romances de época como os adaptados da obra de Jane Austen, por exemplo, basta recordar de histórias de amor como Orgulho e Preconceito e Razão e Sensibilidade. O prazer visual e auditivo da película torna-se, respectivamente, a sutileza do flerte e o romantismo do discurso. Ainda que Fanny dê o tom da conquista, da aproximação mais intensa, demonstrando que ela tem um comportamento emancipado e passional e está perdidamente apaixonada por Keats, o relacionamento amoroso nasce com delicadeza e vivencia as resistências das convenções sociais, logo, os enamorados desejam um ao outro e lidam com o amor vivaz que não pode ser expresso em gestos ardentes e impulsivas ações, então as palavras são transformadas em toques corporais para o gozo dos amantes e o diálogo cria espaço para o flerte; o desenvolvimento do apaixonante relacionamento é absorvido por uma insinuante tensão afetiva que transita entre o desejo e o amor, entre o corpo e a alma. Não faltam encontros e desencontros entre eles, com cenas de românticos beijos e olhares, incontrolável ciúmes e sofrimentos advindos da solidão e da saudade, porém tudo é muito bem articulado pelo roteiro de Campion a fim de evitar que o nascimento do primeiro amor leve a película a um dramalhão cheio de clichês culminando em um tipo de "morte" narrativa.
"Como era horrível a possibilidade de descer à sepultura, em vez de estar em seus braços"
O elenco se compromete a não pôr abaixo a qualidade da obra, mas não supera o diferencial da película que é como ela traduz o sentimento amoroso a partir das imagens, com a excelência da fotografia, da direção de arte, do figurino e do background literário de Keats (que cria imagens mentais através da sua poesia). Annie Cornish e Ben Whishaw têm uma razoável química, não brilham tanto aos olhos do espectador como outros casais românticos do Cinema, falta ainda carisma e sexy appeal entre eles. Há determinados momentos que o romance poderia ser mais intenso e tocante a partir da combinação química dos atores e neste contexto sensível de dramático do amor. Por outro lado, se a direção do elenco selecionasse um casal muito bonito, impregnado de sensualidade e visualmente mais maduro, o resultado final seria inverossímil com a biografia desta paixão, e poderia devastar o tom inocente do primeiro amor. Cabe à ótima interpretação 'inconveniente' de Paul Scheider dar o tom dinâmico que problematiza o relacionamento já que ele é bem chato e não suporta Fanny, sendo contra o envolvimento do casal. Inclusive, sob o ponto de vista social, Brown é um relevante personagem porque ele é aquele intelectual que 'aponta o dedo' a Fanny e a critica como a tola que 'costura e flerta nos bailes', ele se torna a expressão crítica da sociedade que marginaliza as mulheres; mais adiante ele se torna aquele que "critica mas não olha o próprio umbigo" e tem péssimos comportamentos. Nas irônicas cenas de embate entre Fanny e Brown, o filme expõe um ritmo menos parado porque traz a variável do conflito que gera uma resistência ao amor de Keats e Fanny.
"E em uma estranha linguagem, ela disse: Eu te amo de verdade"
O próprio senso artístico e sensibilidade da Jane Campion agregados ao primor estético, ao lirismo literário dos romances de época e ao foco argumentativo do primeiro amor das discretas descobertas embaladas por contidos desejos faz de Brilho de uma Paixão uma ode cinematográfica a um amor da juventude, uma poesia em imagens que é desenhada através da sublime fotografia de Greig Fraser e um texto que valoriza o lirismo do desabrochar para o amor. O deleite cinematográfico nesta película é exatamente voltar ao renascer de um amor jovial, romântico e poético, o amor de época, o amor dos cadernos de Literatura, o amor passional dos poetas pobres e das nobres moçoilas, e observar como a cineasta dirige a câmera nos detalhes da paisagem, nas atitudes dos amantes, nos objetos que guardam os segredos da paixão, tudo com o propósito de vivermos a amorosidade do período. Ao assistí-lo, perceba as cenas dos passeios na floresta, das brincadeiras no jardim com as borboletas, dos presentinhos a Keats, das belas flores, do primeiro beijo, do sofrimento da distância, tudo é liricamente dirigido com a intenção de versar um poema através das imagens fílmicas, assim como a delicada sedução dos gestos enquanto os amantes criam suas próprias obras: Quando ela costura com a precisão dos pontos da agulha; quando ele recita as cartas de amor e combina novos versos.
"Nunca conheci antes o tipo de amor que você me fez sentir"
No geral, o longa-metragem ganha a audiência pelo romance de época e pela apreciação contemplativa da obra. Quem gosta de dramas românticos que resgatam a aristocracia Britânica, têm mais chances de se encantar pelo filme porque aqui, o amor é terno, supremo, a Fanny, não lhe importa se Keats não tem dinheiro e está enfermo, ela o ama profundamente, lealmente. No mais, Bright Star não é um trabalho formidável, mas também tem a agradabilidade visual do trabalho de Jane Campion e da poesia de John Keats, um dos grandes expoentes do Romantismo Inglês. Vale ressaltar que, para o filme ser desfrutado nas suas virtudes técnica, biográfica e literária e no belo contexto amoroso, é importante que o expectador compreenda que este é um romance do século XIX, um amor que foi interrompido pela morte prematura de um poeta pobre aos 25 anos; que é dirigido por uma mulher que domina este tipo de estética mais sensível, lírica bem voltada para o universo aristocrático e feminino e, primordialmente, ter em mente que é essencial apreciar Brilho de uma paixão em um romântico estado de espírito, do contrário, o brilho da película será ofuscado por um olhar turvo e pouco inspirado que fatalmente subestimará o retorno de Jane Campion e seu novo romance.
Avaliação MaDame Lumière
Título Original: Bright Star Origem: Inglaterra, Austrália,França Gênero(s): Drama, Romance Duração: 119 min Diretor(a): Jane Campion Roteirista(s): Jane Campion Elenco: Abbie Cornish, Thomas Sangster, Ben Whishaw, Paul Schneider, Samuel Barnett, Kerry Fox, Roger Ashton-Griffiths, Samuel Roukin, Antonia Campbell-Hughes, Sebastian Armesto, Olly Alexander, Jonathan Aris, Adrian Schiller, Alfred Harmsworth, Joyia Fitch

5 comentários:

  1. Este é o tipo de filme que eu gosto e tenho tudo para amar "Bright Star". Espero poder conferir em breve!

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  2. Estou doido pra ver este filme (novidade, né?)..
    Adoro filmes britânicos e este me parece mesmo ser muito bom!

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  3. Dietrich,

    Eu gostei muito do 'Piano' e faz tempo que não vejo a Holly Hunter tão bem num filme, só recentemente naquele 'Aos 13' da diretora de Crepúsculo enfim....rs! O assunto aqui é outro...

    Quanto a nova direção da Jane, creio que um dia ela vai receber um prêmio Oscar, como a Bigelow.
    Apesar de algumas derrapadinhas, seus filmes não chegam a ser totalmente irregulares.

    O Ben Whishaw, acho um ótimo ator desde 'Perfume' e como na história de um assassino, vejo que neste filme, ele também faz um personagem trágico.

    O que era o amor?

    Só naquela época?

    Apesar da quase tragédia grega e morte prematura, eu curto este estilo de época. Me cativa...eu respiro ar puro, rs!

    "Quando ela costura com a precisão dos pontos da agulha; quando ele recita as cartas de amor e combina novos versos". Nossa! Deve ser muito romântico. ♥!!

    Vou conferir o filme. Com certeza! Mas agora só no DVD.

    Bjs,

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  4. Confesso que estava entusiasmado para ver este filme quando debutou em Cannes ano passado, agora esse turpor já se esvaiu. Devo assisti-lo apenas na tv por assinatura. Sua crítica foi bastante contemplativa, dá para perceber que vc "sentiu" o filme.
    bjs

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  5. A melhor crítica que já li sobre este filme, pois capta bem a essência poética e imagética que o filme tem. É, de fato, um apurado filme que demonstra a noção de romantismo das antigas, amor juvenil, laços de cumplicidade e só Jane Campion poderia propor isso, um filme que é lento sim...que tem o desenvolvimento sutil, nada é exagerado, mas que se manteve como um bom espetáculo denso ao fim...e achei a direção cuidadosa mesmo, não esperava tanto.

    Beijo!

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