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Por  Cristiane Costa ,  Editora e blogueira crítica de Cinema, e specialista em Comunicação Custódia ( Jusqu...

Custódia (Jusqu'à la garde, 2017)







Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação



Custódia (Jusqu'à la garde, 2017), o primeiro longa-metragem de Xavier Legrand é um soco no estômago. Com tema indigesto como a violência doméstica que age como um monstro imprevisível, o filme utiliza temáticas cotidianas como o conflito pós divórcio,  a custódia compartilhada, a brutalidade psicológica e física e o risco de homicídio familiar para mostrar o entrelaçamento entre a cruel realidade e o horror psicológico. Com a competência do diretor e elenco, Custódia é um moderno filme de terror sobre o cotidiano familiar disfuncional.




"o filme começa com a racionalidade das palavras e termina com um horror quase irreal. Foi uma decisão consciente. A quem não conhece de perto, essa violência parece incompreensível e inimaginável” (Xavier Legrand)



Na história, Antoine Besson (Denis Ménochet) e Miriam (Léa Drucker) se divorciam e competem pela guarda do filho menor, Julien, (Thomas Gioria). Antoine é o típico homem bruto, covarde e amedrontador. Incapaz de aceitar como sua presença não é bem vinda, ele age de forma persecutória a assustar sua ex-esposa e seu filho. Similar aos casos policiais que estão relacionados à violência doméstica e que crescem em número na mídia, Antoine é o personagem invasivo e desagradável ao qual ninguém deseja estar por perto.  Como é intragável e divide a guarda, passa a buscar o filho Julien em situações que geram um profundo sofrimento no garoto presente em cenas impactantes de violência psicológica muito bem dirigidas por Xavier Legrand. 




Filme vencedor de Melhor Direção e o Melhor Primeiro Filme no Festival de Veneza (2017) e  Prêmio da Crítica na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo (2017). 



A boa construção do filme puxa a realidade para diante dos olhos da audiência e se destaca como uma de suas maiores qualidades. Ela é realista e cresce rumo a um clímax de extremo horror. Esse movimento mostra como essa violência é palpável, se insere no dia a dia e está muito próxima ou nos lares. Provavelmente alguém já ouviu ou presenciou um caso familiar semelhante ou conhece um homem como Antoine, entretanto, na maioria das vezes, a violência que parte de casais separados ou em separação é algo incompreensível que, principalmente, coloca mulher e os filhos em um estado de alerta aterrorizante, um crescente medo de permanecer a sós com o agressor.


Xavier Legrand joga o público em uma espiral de iminente risco de tragédia. Medo e incômodo fazem parte da experiência cinematográfica, para isso, o diretor realiza um primoroso trabalho de decupagem nos planos em que Antoine se aproxima de Miriam e Julien. Em um dos planos iniciais, Antoine é um homem rígido, perigoso e mentiroso, que não respeita nem o momento de fala da juíza. Mais adiante, suas aproximações a Miriam mostram que não é possível confiar nele, tanto que a excelente atuação de Léa Drucker demonstra que ela não sente mais nada por ele, que permanece em estado de atenção e medo diante de tanta instabilidade psíquica.


Como um dos melhores acertos estão as tomadas dentro do carro em movimento com Antoine e Julien. As sequências provocam um tenebroso mal estar. Ele dirige rápido e tem gestos agressivos, assim, a todo o momento, a narrativa apresenta a sensação de insegurança e medo provocada por Antoine como se ele fosse jogar o carro sobre outro ou machucar o filho. Sua instabilidade não tem limites, deixando a família em momentos de extrema vulnerabilidade emocional.








Nessas cenas específicas no carro, a extraordinária performance de Thomas Gioria ressalta a covardia do pai que, claramente, é um sádico. Totalmente imerso na posse e controle a qualquer custo, Antoine deseja saber detalhes da família, assim, para ele não importa  nem ter um bom relacionamento nem evitar o sofrimento do filho, apenas a posição egoísta de um crápula. A figura do pai  brutal desperta bastante ódio, como um ser desprezível na terra a atormentar mulheres e crianças. A atuação convincente de Denis Ménochet contribui para esse desconforto. Ele atua como um animal irracional, daqueles que não compreendem o não e não sabem dialogar, daqueles que deveriam permanecer em uma jaula.


De uma forma incômoda, Custódia oferece um exercício de experimentação apavorante ao público, assim é possível vivenciar  o inferno de ter um ex-marido correndo atrás de uma família como um  faminto e incansável animal. Não é um filme fácil. Se aproxima a um horror psicológico contemporâneo com o acerto de colocar o ser humano como o ser monstruoso, de personalidade deformada e assustadora, de ações imprevisíveis e experiências traumatizantes.
















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