#Drama #Envelhecimento #CinemaEuropeu #CinemaPortuguês #RelaçõesÉtnicoRaciais #Racismo #Amizade #Morte Estreia nos Cinemas em 30 de Outubr...

Mostra SP: A Memória do Cheiro das Coisas (The Scent of Things Remembered, 2025)

 




#Drama #Envelhecimento #CinemaEuropeu #CinemaPortuguês #RelaçõesÉtnicoRaciais #Racismo #Amizade #Morte


Estreia nos Cinemas em 30 de Outubro de 2025, distribuição da Muiraquitã Filmes


Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação



A Memória do Cheiro das Coisas: Colonialismo, Racismo e o Preço do Envelhecimento




A arte cinematográfica, em sua vocação de expor as tensões da sociedade, encontra na coprodução A Memória do Cheiro das Coisas (Portugal/Brasil) um veículo potente. Dirigido por António Ferreira e exibido na Mostra SP, o filme mergulha em temas urgentes: a fragilidade da velhice, o racismo estrutural e as chagas do passado colonial português em Angola. É um drama que confronta, de forma poética e, por vezes, cruel, a inevitabilidade da morte e a busca tardia por redenção.




A narrativa se estrutura sobre o contraste ético e histórico entre o protagonista, Arménio (José Martins), um octogenário e ex-combatente da Guerra Colonial, e Hermínia (Mina Andala), sua cuidadora negra. A escolha é audaciosa: colocar o racismo como uma doença social grotesca, invertendo o jogo de poder não por vingança, mas para reafirmar a primazia do caráter e da humanidade. Hermínia, com uma educação e empatia acima da excelência, projeta um senso de cuidado que persiste mesmo diante do racismo cotidiano em Portugal.










A vulnerabilidade de Arménio não nasce da ingenuidade, mas da sua própria história de abandono. Ele, que serviu ao país e agora é cuidado por estranhos, é um senhor esperto, capaz de perceber a fibra moral de Hermínia. Sua amargura é consequência direta das feridas da guerra, refletida em um filho imaturo e no distanciamento afetivo de outros parentes.



A revisitação do passado se dá por meio de sonhos no próprio quarto de Arménio, criando um campo de batalha íntimo, onde as memórias se tornam perturbações recorrentes, mas necessárias. Essa inversão espacial é uma justiça poética que nos convida a refletir sobre propósito, legado e as escolhas feitas em uma sociedade adoecida.



A questão do cheiro, que dá nome à obra, é simbólica e bela. Representa um dos poucos laços que o envelhecimento não apaga por completo da mente. No filme, o cheiro humaniza o protagonista, funcionando como lembrança afetiva e força de sobrevivência no campo de batalha. Ainda que o roteiro não explore o título em toda sua potência estética, a intenção é clara: dar dimensão sensorial às memórias de Arménio, como um respiro em meio ao passado sombrio.









A atuação crua e terna de José Martins e Mina Andala é o motor do filme. Arménio é ranzinza, mas revela um lado bom e muito oculto, cedendo à ternura da cuidadora. Essa humanização da relação é um recurso narrativo que deve ser lido com cautela, pois os problemas de xenofobia e racismo ainda persistem em ambos os países. No entanto, o filme é bem-vindo como memória e reconstrução. A dívida histórica não será paga, mas o futuro pode ser mais sábio e ativo ao aproximar as nações.




No desfecho, a amizade entre Arménio e Hermínia é autêntica. De certa forma, ela ocupa o lugar das figuras femininas que já não estão mais por perto. O longa é uma narrativa objetiva, mas necessária, que ilumina a solidão do envelhecimento e a dura verdade de que, muitas vezes, o afeto mais genuíno e a dignidade vêm mais de estranhos do que da própria família ou dos “amigos” do passado.







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