Jovem Afegã pensou que era amor mas era cilada #Dicadestreaming  Por  Cristiane Costa ,  Editora e blogueira crítica de Cinema, e speciali...

Wajma: Uma história de amor Afegã (2013)

 



Jovem Afegã pensou que era amor mas era cilada

#Dicadestreaming 



Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação

 



A quebra de regras culturais e sociais em uma sociedade como a do Afeganistão traz graves consequências para a mulher e sua família e, muito menos para os homens que seguem sendo preservados pelo patriarcado estrutural e indissociável da violenta realidade das diferenças de gênero e da opressão das tradicionais doutrinas religiosas. Em Wajma: Um história de amor Afegã (2013) ambientado em Cabul em uma híbrida narrativa ficcional e documental, o público é levado a observar como uma jovem é seduzida e tem que lidar com o abandono e uma indesejada gravidez.





Mustafa Abdulsatar e Wajma Bahar





Com roteiro e direção de Barmak Akran e atores que usam os próprios nomes, é importante considerar que o filme tem atributos culturais que ultrapassam o certo ou o errado, pois cada país tem sua cultura e deve ser respeitada sem ignorar as bases históricas que a fundamentaram. Diante disso, o drama de Wajma tem ver com uma construção social e como as relações interpessoais e afetivas são mediadas pelas leis, intervenção familiar e a honra.




A ideia de namoro que há no mundo ocidental é completamente diferente em uma sociedade Afegã. Como outros países do Islão, os desejos são mais reprimidos e o casamento é a rota para o sexo e a formação da família. Apesar da modernidade de algumas nações de maioria muçulmana, eles não têm relacionamentos íntimos e/ou sexuais aceitos e liberados naturalmente. Pelo contrário, os relacionamentos têm uma forte base familiar na qual os casais devem ser apresentados e aceitos pelas famílias, além de outros requisitos inclusive de natureza econômica, de status e prestígio. Ademais, à mulher Afegã é destinado um lugar de submissão e confinamento, logo ela não desfruta integralmente da mesma liberdade das mulheres ocidentais, inclusive sendo impedida de frequentar universidades em diferentes períodos históricos.




Com isso, ao observar o filme, ele deve ser contextualizado com a história do país e das relações familiares que ditam as regras de como os indivíduos devem se comportar. Se considerado o ano de 2013, o Talibã já havia saído do poder por um momento, dessa forma, Wajma é uma jovem que foi aprovada na faculdade de Direito e ia a festas de casamentos, ou seja, nada além do círculo educacional e familiar. Ao conhecer Mustafa, jovem de ascendência Iraniana e garçom de um restaurante, nitidamente ele começa a flertar com ela e dizer que a ama. Eles começam a se encontrar às escondidas. Depois, nada diferente do que ocorre em países ocidentais nos quais o homem busca o prazer sexual e usa palavras de amor que não carregam qualquer responsabilidade afetiva.











Para a desonra de Wajma, de acordo com a tradição, ela engravida e começam os problemas reais. De forma muito egoísta, Mustafa ainda questiona a lealdade dela, o que ainda é um absurdo de se ouvir, mas que reproduz comportamentos comuns em homens que não assumem uma mulher e muito menos os filhos. Com uma abordagem bem visceral, a câmera percorre o desespero de Wajma, sua casa humilde e sua família agindo de forma violenta e sofrida diante da gravidez. Sendo assim, não é um filme fácil de digerir mas é muito honesto em mostrar que quase não há saída para essa jovem, a não ser ela contar com o perdão e ação da família para tirá-la desse desespero.





Um elemento interessante em termos sociológicos é observar que o homem tem seus privilégios de ser poupado ao máximo possível e agir conforme os ensinamentos da lei.  O pai de Wajma age com violência física porque foi o que ele aprendeu na estrutura patriarcal e que é permitido. Se a filha falhou segundo a tradição, ele e a esposa também falharam pois serão desonrados pela sociedade. Já Mustafa tem o comportamento inseguro e imaturo, um completo irresponsável sem qualquer atrativo. De sedutor, ele mostra a máscara da covardia pois sabe que sofrerá as consequências de ter violado a jovem, sabendo claramente que deveria ter assumido um compromisso matrimonial se assim a desejasse como esposa e amante.






Com todo o drama realista das cenas, há uma trágica variável que permeia todo o filme: a culpabilização da mulher. Wajma foi seduzida e, no decorrer da história, ela é agredida de diversas formas violentas e para a qual a morte seria um alívio.  A culpa é colocada nela e em sua mãe, dessa forma, o título do filme não é sobre Amor, mas sobre uma mentira, uma grande cilada.






Há amor em casamentos arranjados e nos quais a mulher não tem seu lugar de autonomia e liberdade? Há amor quando é apenas sexo e não sobre valorização afetiva da mulher? Há amor quando não existe diálogo para compreender essa desilusão amorosa e as emoções femininas? Há amor quando a mulher está sozinha e tem que agredir o próprio corpo para escapar de uma "morte social"? Não há amor nesse contexto! O que existe é controle para atender o desejo masculino, algo que não é exclusivo de sociedades mais tradicionais, mas também em países ocidentais que mascaram esse controle dos corpos femininos. 




(3,5)






0 comments:

Caro(a) leitor(a)

Obrigada por seu interesse em comentar no MaDame Lumière. Sua participação é essencial para trocarmos percepções sobre a fascinante Sétima Arte.

Este é um espaço democrático e aberto ao diálogo. Você é livre para elogiar, criticar e compartilhar opiniões sobre cinema e audiovisual.

Não serão aprovados comentários com insultos, difamações, ataques pessoais, linguagem ofensiva, conteúdo racista, obsceno, propagandista ou persecutório, seja à autora ou aos demais leitores.

Discordar faz parte do debate, desde que com respeito. Opiniões diferentes são bem-vindas e enriquecem a conversa.

Saudações cinéfilas

Cristiane Costa, MaDame Lumière

Pesquisar este blog

Críticas mais Visitadas (Última Semana)