Feirantes são protagonistas do documentário
e mostram a desigualdade social no país
Lançamento nos Cinemas em 03 de Abril em São Paulo e Rio de Janeiro pela California Filmes
Por Cristiane Costa, Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação
Primeiro filme de Silvia Fraiha como cineasta, Todo dia é dia de feira (2023) mostra o protagonismo e a resiliência de quatro feirantes profissionais, Arnaldo, Cristina, Fernando e Luis, que trabalham nas feiras livres cariocas. Apaixonada por essa cultura, além de frequentadora das feiras desde a infância, a diretora apresenta um documentário valioso para compreender a luta diária dos feirantes que, em meio às desigualdades sociais no país, representam a resistência na ocupação de seus territórios e no exercício de seu trabalho diante do descaso do Estado.
Arnaldo
Com muita fluidez e naturalidade, a câmera percorre as feiras com sua alegria urbana e pitoresca, entre as cores vibrantes das frutas, o aroma das ervas e a beleza das flores. Essa paisagem colorida traz uma força tremenda para que isso não desfaleça em um país no qual nem sempre o feirante é valorizado. Com o protagonismo desses trabalhadores, cada um com sua experiência e estilo muito único, o público é convidado a compreender suas realidades que vão além da vivacidade de uma feira, mostrando também as contradições da melancólica luta pela sobrevivência.
Cristina
Responsável pela produção, roteiro e direção, Silvia Fraiha e sua voz serena na narrativa tem uma grandiosa virtude: ela entende desses amores e dores pois, ainda que tenha um lugar de privilégio, ela vivencia as feiras livres e escolheu esse tema como um projeto de Cinema, inaugurando sua direção em longas metragens. É uma atitude que está acima do seu papel como cineasta, mas uma ação cidadã, de ímpar nobreza em dar voz à categoria. Ao retratar Cristina, Arnaldo, Luis e Armando tanto na feira como em suas famílias e comunidades, ela mostra a humanidade do feirante para além de uma banca bem montada e atrativa em uma feira. Insere os sonhos, desejos, vulnerabilidades e desafios dos trabalhadores que preservam uma tradição. Acima de tudo, os feirantes representam essa esperança de não serem excluídos como trabalhadores de valor em uma sociedade desigual.
O documentário ganha uma dimensão de crítica social sem abandonar a leveza e alegria dos feirantes. São diferentes retratos que refletem suas identidades em tantos outros trabalhadores espalhados pelo Brasil. Acompanhamos Cristina, um mulher negra, viúva e arrimo de sua família que levanta cedo e vai até um Ceasa para garantir boas frutas; Arnaldo, pai de família e morador da Rocinha que, com o filho, sobrevivem às caras diárias de manter uma peixaria ambulante; Luis, o senhor experiente que vende melancias sem perder sua calmaria e Fernando, o florista que mantém essas cores da natureza por amor à feira e à família. Todos apaixonados pelo seus ofícios, movendo o documentário com histórias de superação, humor e autenticidade e respeito pela cultura das feiras livres.
Como resistência, o documentário nos faz refletir sobre como o sistema opera de uma forma a negligenciar e/ou prejudicar o empreendedor feirante. Há um sistemático processo de sobreviver a esse negócio, desde o feirante buscar a mercadoria em um mercadão ou Ceasa, até realizar o tratamento das frutas, legumes, verduras, flores, entre outros, passando pela conquista e venda do produto ao cliente, o estoque e/ou descarte do que não foi vendido e a gestão financeira do próprio negócio. Analisando essa perspectiva, parece simples mas não é, sendo extremamente trabalhoso para um trabalhador que tem poucos recursos, além do mais, feirantes que encontram como poderosos concorrentes as grandes redes de supermercado que utilizam de eficiente logística e ações predatórias de vendas e marketing. Assim, a desigualdade não é apenas social, mas uma desigualdade mercadológica.
Com esse excelente documentário fica mais evidente o descaso do Estado, que coopera para essa desigualdade não dando a devida importância à feira como um patrimônio cultural nos variados territórios e parte relevante do empreendedorismo familiar e direito ao trabalho. Na situação exposta nas filmagens, é lamentável o total desconhecimento de um secretário público com relação ao funcionamento das feiras livres e melhores condições de trabalho para o feirante. Assim, ao observar essa falta de compromisso do Estado, entendemos o porquê documentários com o de Silvia Fraiha são fundamentais para dar voz contra o apagamento e silenciamento dos feirantes.
Imagens integram divulgação do filme. Autorizadas pela assessoria de imprensa California Filmes para a imprensa.






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Cristiane Costa, MaDame Lumière