Por Cristiane Costa, Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação
Um recorte dramático do cotidiano de Samira (Linda Mresy), garota Tunisiana de 10 anos e imigrante ilegal na Itália, é o argumento para o curta-metragem Bismillah (2018), de Alessandro Grande. Com duração de 14 minutos, o roteiro centraliza a ação em uma noite que Jamil (Belhassen Bouhali), seu irmão de 17 anos, está com fortes dores no corpo e Samira está sozinha com ele. Ao canto de "Bismillah", expressão muçulmana em árabe para "Em nome de Allah", a garota evoca os versos muito comuns no Islão.
A narrativa com o uso de uma música simbólica na fé muçulmana leva a um olhar de que, quando faltam recursos e o imigrante se encontra em uma situação desesperadora, a fé permanece, alguma esperança suaviza as aflições. É um recurso cinematográfico de recorrência neste contexto. A garota repete os versos em alguns planos, reforça um clamor de socorro para que Deus misericordioso a fortaleça, que ela encontre alguma ajuda para o irmão e ele se recupere logo.
O diretor se apoia bastante na canção e no close da garota, evidenciando uma necessidade emocional de mostrar o semblante de Samira entristecido e esgotado, entretanto, o mérito do curta é como ele consegue inserir elementos que fazem parte da condição de um imigrante ilegal, bastante restrita e em segredo, e também como ele realiza o desfecho do curta utilizando o recurso narrativo que move a história.
Nesta triste condição, os imigrantes têm medo de serem presos e extraditados, além de as próprias pessoas locais terem receio de ajudá-los. Samira é uma personagem que carrega um peso grande para uma criança. Levar Jamil a um hospital não é uma opção, assim, o peso se torna bem maior. Se ela buscar ajuda oficial, poderá colocar em risco a permanência da família na Itália.
Para efeito dramático, a ideia de um adolescente sob o risco de ter uma dor mais severa e vir a óbito é eficiente, assim como colocar uma criança como protagonista. Trabalhar com personagens que estão passando pela infância e pela adolescência traz à ficção o realismo de como as crianças e juventudes são tratadas quando imigrantes e refugiados. Eles estão sozinhos ou a mercê da ajuda alheia, da sorte e fé. Eles não têm direitos básicos nos países que ingressam pois a maioria está ilegal.
Sob a perspectiva do contexto Italiano, o documentarista Gianfranco Rosi já havia realizado um filme que fala sobre a crise imigratória na Europa, enfocando a própria Itália. Em "Fogo no Mar" (Fuocoammare, 2016), ele mostra as condições que entram os imigrantes de países Africanos e do Oriente Médio no sul do país. Alessandro Grande, que tem experiência em curtas com personagens à margem da sociedade como pessoas no sistema prisional e imigrantes, desta vez, adentra o ambiente familiar com personagens que fazem pensar qual será o futuro dessas jovens gerações sem lar.
Com dores desconhecidas que apenas um especialista poderia definir, a condição de Jamil deixaria qualquer um de mãos atadas. Sendo sua irmã ainda criança, e sem contar com o pai, com quem vive, Samira está absurdamente solitária, batendo de porta em porta como uma pedinte, em uma condição humilhante. Esta situação lamentável expressa uma realidade da imigração na Europa mas também em países como os Estados Unidos como é o caso dos Mexicanos na fronteira neste governo Trump ; é uma realidade que não protege nem mesmo as crianças e adolescentes.
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