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Por  Cristiane Costa ,  Editora e blogueira de Cinema, e specialista em Comunicação   Destaque nas programações do último Festival Va...

A viagem de Fanny


Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira de Cinema, especialista em Comunicação 


Destaque nas programações do último Festival Varilux de Cinema Francês e do Festival de Cinema Judaico, "A viagem de Fanny" (Le voyage de Fanny) é o terceiro longa-metragem da diretora Lola Doillon (de "Contre toi"). O filme apresenta a jovem Leónie Soluchaud, que nunca havia atuado como atriz, no papel da heroína Fanny. Ela é uma garota de 12 anos que, com as irmãs e outras crianças, atravessam a França ocupada pelos nazistas. Inspirada pelo romance e consultoria de  Fanny  Ben-Amy, a cineasta conta as memórias do Holocausto sob o ponto de vista infantil. 




Como em "Os meninos que enganavam os nazistas", A viagem de Fanny é um drama de sobrevivência que não está alicerçado em enfatizar visualmente apenas os  males e destroços da guerra. Eles estão lá, porém de outra forma: a perseguição, o abandono, o risco da orfandade, as saudades da família, a resistência. Mas, doçura, espontaneidade e leveza do elenco infanto-juvenil cooperam com a narrativa para apaziguar qualquer efeito muito obscuro, pesado. É a força das crianças que faz a diferença para catalisar as emoções. Em variadas cenas, o que salta nas atuações é a perspectiva de que as crianças, ainda que não tenham total noção do perigo que as cerca, mantêm o protagonismo que requer um pouco de fantasia e ingenuidade. Diante disso, o filme precisa ser apreciado com um olhar menos exigente e mais fabuloso, de modo a valorizar a importância do acolhimento, da coragem, da generosidade e da solidariedade.






Fanny é uma líder, uma jovem que está passando da infância à adolescência. É uma heroína essencial para manter o grupo em segurança e com foco em atravessar a fronteira para a Suíça, portanto, a maturidade de Leónie Soluchaud é impressionante no seu primeiro papel, evidenciando ser um potencial talento para novos trabalhos no Cinema. Ela encarna um equilíbrio entre audácia e  medo, bastante pertinente ao rito de amadurecimento. Ao olhar para sua câmera pessoal, ela busca forças através do lúdico e da memória. Mesmo que cuidar das irmãs e das demais crianças traz uma responsabilidade de peso, a história fortalece o contraponto de que é preciso amadurecer em um cenário de imprevisibilidades e ausência do pais. 






De forma favorável, o elenco infanto-juvenil é bem profissional. Os atores - mirim foram muito bem selecionados após mais de 1000 candidatos que passaram pelo crivo da diretora. Cada um com seu jeito único de ser garante personalidade à equipe. O roteiro tem o cuidado de não calar essas crianças e acerta na miscelânea de perspectivas e sentimentos infantis durante a jornada, principalmente o quão é comovente ver a angústia delas diante do desconhecido. 








Nesse contexto, a personagem de MaDame Forman, interpretada por Cecile de France, reforça o precoce e inevitável amadurecimento das crianças para a sobrevivência. Em uma das cenas, ela é demasiado rígida, a ponto de gerar dúvidas: está ali para ajudar as crianças ou subjugá-las com tanta autoridade e frieza?  Mas, esse comportamento dá uma dimensão de que havia adultos que eram responsáveis por desenvolver o espírito independente das crianças, muitas vezes, anulando o sentimentalismo. Os pais de "Os meninos que enganavam os nazistas" também tinham esse comportamento, divididos entre a proteção da cria e a urgente necessidade de preparar os filhos para encarar as adversidades da fuga. 





Quando as crianças aparecem mais leves, o espírito é de brincadeira, otimismo e união. Suavizar essas cenas  dá uma ligeira impressão de que nem parece que elas estão sob a mira dos nazistas  e podem morrer a qualquer momento, o que também gera um sutil estranhamento já que a tendência, até mesmo do público em geral, é esperar que filmes de Holocausto sejam sérios e sofridos demais. Por outro lado, essa é uma estratégia narrativa em cheio para elevar o olhar da criança em um mundo de adultos que declaram guerra. Vê-las sorrindo e correndo pelo campo não quer dizer que elas não estejam sofrendo. Subestimá-las no que elas têm de mais sonhador e esperançoso é um erro. Desse modo, sentimentos bons e ruins caminham com eles a cada passo, a diferença é que existe uma meiguice na perspectiva infantil que ilumina essa caminhada.


Com a bela fotografia de Peter Cottereau, são esses momentos solares em tempos de escuridão que rompem as fronteiras físicas e emocionais da guerra e inspiram à libertação e a resiliência. Essa é uma instintiva aventura que prediz: é difícil sobreviver sem união e coragem. Recuperar as memórias de uma história de superação ajuda o público a enfrentar épocas frágeis e desafiadoras e todos os holocaustos diários que tentam abater a humanidade.







Ficha técnica do filme Imdb A viagem de Fanny

Fotos: uma cortesia, Mares Filmes

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