Com produção executiva do influente de J.J. Abrams conhecido por Star Trek, Star Trek - Além da Escuridão e série Lost, Sentimentos que curam (Infinitely Polar Bear) é o primeiro longa-metragem da roteirista Maya Forbes. Para sua estreia na batuta da direção, ela optou por uma história bem pessoal de sua família e realiza um drama com toques de humor ambientado em Cambridge. Quando era criança, Maya vivenciou uma fase que seu pai, um maníaco-depressivo, teve um forte colapso. Além de ela e sua irmã conviverem com a bipolaridade dele e dificuldades como a falta de emprego, dinheiro e mudanças de escola, seus pais se separaram. Com o objetivo de buscar melhores condições de educação e qualidade de vida para as filhas, sua mãe foi morar em Nova York. Maya e sua irmã ficaram sob os cuidados do pai, recebendo a visita da mãe apenas aos finais de semana.
A história segue este argumento: filhas que são criadas pelo pai bipolar durante a ausência temporária da mãe. Cameron (Mark Ruffalo) é apresentado no meio de uma crise maníaca. Seu casamento com Maggie (Zoe Saldana) está por um triz. Ele precisa superar o colapso, ela está desempregada e precisa sustentar as filhas Amelia (Imogene Wolodarsky) e Faith (Ashley Aufderheide). Apesar do momento crítico da família, a energia entre eles é amorosa, incrivelmente de superação, de tomar algumas decisões difíceis e deixar a vida acontecer. Nisto está o crédito que deve ser dado à Maya Forbes. Ela sentiu na pele este drama e opta por um texto leve e não estereotipado porque, verdadeiramente, ela aprendeu a conhecer um bipolar de verdade e, o melhor, sabe o valor do seu pai. Ainda que use algumas situações comuns do transtorno em nível mais severo de mania, como tomar atitudes embaraçosas em público ou perda temporária de um senso de realidade, situações que impactam o convívio com os outros, a roteirista preza pelo afeto, pelo humor, pela honestidade na narrativa.
Muito mais do que um filme com elementos biográficos, Sentimentos que curam é um belo exemplo de drama eficiente que abraça uma questão universal: aceitação de que somos quem somos, não importa quais transtornos mentais ou deficiências temos, todos merecemos ser aceitos e não subestimados em nossas capacidades intelectuais, físicas e afetivas. Não somos limitados por uma X ou Y doença. Não somos melhores ou piores do que outros, somos apenas seres humanos que têm talentos e, também, desafios pessoais em nossas personalidades, temperamentos etc. Com a atuação consistente de Mark Ruffalo, excelente ator em dramas mais realistas e independentes, a bipolaridade é tratada com dignidade. As jovens atrizes e Zoe Saldana cooperam com atuações bem alinhadas ao ator e com o cotidiano de quem convive com um bipolar. Aqui, o mais positivo na relação da família é que ela não o trata como uma "vítima". A sinceridade existe nos diálogos.
Ainda que a diretora opte por equilibrar o humor com o drama e o lado mais obscuro da bipolaridade é pouco demonstrado, é possível observar as leves nuances comportamentais que se relacionam à alterância entre a mania e a depressão de Cameron. Mark Ruffalo é tão bem sucedido na interpretação, que ele não deixa o personagem cair no descrédito, reforçando que foi uma ótima escolha e um dos poucos em Hollywood que seriam realmente bons para este papel. ´É importante considerar que, mesmo que esta seja uma ficção baseada em fatos reais, a roteirista foi muito competente em fugir ao máximo do estereotipo do transtorno e não ridicularizar e/ou ofender quem é bipolar. A sociedade, em geral, usa o termo bipolar com irresponsabilidade, equívocos e falta de conhecimento sobre os diferentes graus de severidade da alteração de humor. Além de existir muito preconceito com a bipolaridade por pura ignorância. O filme ajuda a compreender parte dos comportamentos de bipolares que têm mais episódios maníacos do que depressivos, também ajuda a perceber a sensibilidade e inteligência de Cameron.
Com uma narrativa agradável, o filme acerta em desenvolver um núcleo familiar e colocar Cameron em um convívio com as filhas que o ajuda a ter uma rotina e a colocar mais e mais em prática sua missão como pai. Ela faz uma boa montagem, com recortes de imagens filmadas com câmera na mão como se fossem vídeos caseiros de uma família e inclui cenas bem cotidianas desta convivência com tomadas internas no apartamento e com os novos amigos da filha. Também, ao diluir no texto um desafio pessoal para Cameron sem que ele perca sua essência bipolar, que tem inúmeras qualidades e ótimos momentos afetivos no longa, Maya Forbes transmite ao público um dos melhores aprendizados do filme: Não há o que esconder! A bipolaridade é desafiadora e tem seus momentos dolorosos, mas, ela é gerenciável. Amigos e família aprendem o valor do verdadeiro Amor nestas circunstâncias, um Amor que tudo vence e tudo tolera, e são os sentimentos que curam que realmente importam.
Ficha técnica do filme ImDB Sentimentos que curam
Distribuição: Imagem Filmes
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