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Por Cristiane Costa, Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação
As Provadoras de Hitler: O Trauma Feminino e o Gosto Amargo da História
As Provadoras de Hitler, de Silvio Soldini, é um filme com imenso potencial dramático que revela o silêncio imposto à história de inúmeras mulheres durante a Segunda Guerra Mundial. A narrativa resgata memórias de mulheres oprimidas e invisibilizadas, confrontando a omissão histórica da violência de gênero. O verdadeiro horror do totalitarismo é exposto no terror do paladar: jovens foram coagidas a sair de suas casas, sob ameaça militar, para provar a comida de Adolf Hitler. A cada garfada, poderiam morrer, tornando a espera pela morte algo legitimado pelo poder ditatorial. Soldini subverte a narrativa clássica de guerra, mostrando que as trincheiras estavam espalhadas no cotidiano, e que a violência íntima, longe do campo de batalha, era igualmente letal.
O filme acompanha Rosa Sauer (Lisa Schlott), uma jovem que retorna à casa dos sogros em Berlim, vivendo na angústia da espera pelo marido que está na guerra. Ela e outras mulheres são obrigadas a servir de cobaias para a comida de Hitler, uma lógica cruel que expõe o paradoxo da sobrevivência: não podem ser integralmente inimigas do poder, mas são forçadas a servi-lo. O clima de suspeita e tensão psicológica é intenso, inclusive dentro do próprio grupo feminino, pois a cumplicidade pode se converter em inimizade a qualquer momento. Elas se aliam por carência ou por imposição moral, uma escolha feita unicamente para se manterem vivas. A chegada do militar Albert Ziegler (Max Riemelt), que supervisiona as provadoras, intensifica essas ambiguidades, revelando a tensão entre o terror e a atração humana em um ambiente onde o poder dita a moral.
Embora o filme revele excelente qualidade cinematográfica, sua força climática e crítica social não se desenvolvem plenamente, instalando-se mais como um drama histórico de silenciamento feminino. Essa limitação ocorre porque o próprio ambiente claustrofóbico do bunker, onde as provadoras comem sob constante vigilância, restringe as camadas dramatúrgicas. Em empatia com o diretor, a própria condição das mulheres as limita em cena: são prisioneiras de guerra que não podem fugir, amar ou expressar-se livremente, sendo abordadas por homens movidos por opressão ou desejo. Esse contraste cruel entre o alimento, que deveria ser prazer, e a gaiola do bunker é o ponto de inflexão da mise-en-scène. Torna-se compreensível que há histórias que exigem ser mostradas em sua crueza, mesmo que isso limite o ritmo narrativo.
A relação entre as provadoras é tensionada pelo roteiro e pela ambiência histórica. O texto oferecido às atrizes as limita, mas elas ainda cumprem a missão de atuar em um clima de desconfiança que expressa a opressão. Há poucas cenas de resistência explícita e humanidade, mas quando surgem, evitam o melodrama, focando na paranoia e no desespero. O alívio reside no último fio de esperança de contar umas com as outras. Essa dinâmica não traduz um grupo unido. É provável que o próprio clima de terror as submetesse à depressão e à paranoia. Sob a perspectiva de gênero, a narrativa confronta a expectativa da irmandade feminina ao mostrar como a luta pela sobrevivência individual e as ideologias divergentes persistem, expondo a dor de um círculo onde, lamentavelmente, ainda falta a verdadeira fraternidade.
O filme tem um estilo notável, com cortes frios que expressam o ambiente desumano no qual as vidas são decididas pela guerra. O diretor opta por um drama histórico conduzido pelo suspense psicológico, tensionado pela insegurança e pela ausência de confiança. Por isso, não é um filme que salta como mainstream de outras obras consagradas do cinema de guerra. Ainda assim, possui a sutileza da opressão e da invisibilização feminina, que se manifesta na narrativa pelo grito, pela ameaça, pelo desejo, pela ofensa, pela humilhação e pela solidão. A contribuição de As Provadoras de Hitler é inestimável, atuando como um filme de denúncia Pós-Segunda Guerra, que resgata o que foi apagado. A memória ressoa até hoje, sobretudo em relação à violência de gênero. O filme nos lembra que as trincheiras estão no cotidiano feminino, e o manifesto final que deixo é que temos que sobreviver, mas, sobretudo, pensar em outros mecanismos de resistência.
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Cristiane Costa, MaDame Lumière