Mostra SP 2020 - 22 de Outubro a 04 de Novembro
Por Cristiane Costa, Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação
Radicado na Grécia, onde estudou Cinema, o diretor Iraniano Siamak Etemadi realizou Pari (2020), um filme feminino e ousado em contraposição ao conservadorismo na História e Cultura do Irã. Se ele vivesse na sua terra natal, seria perseguido, preso ou morto pela forças repressoras. Pari narra a jornada transformadora de uma mãe em busca do filho Babak em Atenas. Protagonizada pela atriz Alemã-Iraniana, Melika Foroutan, Pari é o centro da narrativa em todos os sentidos. Babak é somente o que a move.
A ideia do roteiro surgiu como um desejo do diretor de imaginar o que sua mãe faria se, ao chegar ao aeroporto de Atenas, não o encontrasse e nem conseguisse qualquer contato com ele. Ela voltaria para o Irã? Buscaria outras fontes de informação? Desistiria da busca após algumas tentativas? Certamente, uma mãe se arrisca a tudo pelo filho, mas até que ponto? Em quais lugares ela estaria disposta a entrar? Com quais tipos de pessoas ela conversaria? Quais mudanças ela vivenciaria?
O cineasta coloca Pari em uma Atenas decadente e sombria, fugindo de uma jornada tradicional de buscar autoridades governamentais e pessoas politicamente corretas. Na verdade, trata-se de uma caminhada intimista, solitária e desesperada na qual, em distintas situações e com poucas interações, ela adentra o submundo da cidade e conhece outras pessoas que vivem e pensam diferente de um Iraniano como jovens anarquistas e prostitutas.
Com o bom uso do simbólico em determinados planos, o cineasta utiliza representações que são relevantes para desenvolver e mostrar essa ideia de autoconhecimento e libertação de Pari. A narrativa ocupa-se de colocá-la em situações fora do comum para uma Iraniana tradicional. Para isso, por exemplo, o véu muçulmano "hijab", que cobre a cabeça de Pari, é um objeto a acompanhar essas mudanças na personagem, além do mais, as experiências relacionadas a cenas violentas como ação policial e de abusador desafiam Pari ao enfrentamento.
Diante de tantas situações diferentes, é interessante observar como ela chega ao aeroporto e como ela encerra o filme. Muito mais do que a mudança psicológica, há uma mudança física, passando da figura sacralizada da mulher para uma visão mais autêntica e dona de si. Com pertinência, o diretor utiliza alguns close-ups importantes para transmitir essas mudanças físicas e comportamentais, assim, de uma bela e libertadora maneira, Pari vai sendo descoberta de toda a rigidez. Ela também confronta-se com as dificuldades do idioma, ainda assim, lê o livro deixado pelo filho e, como uma conexão de palavras e atos, traduz algumas linhas e dá vazão à subjetividade e reflexões.
Pari é uma metáfora da transformação de uma mãe. É a jornada angustiante de uma mulher que não pode viver tudo o que acreditava mas, pelo filho, seria capaz de desafiar as convenções e perigos. É a caminhada de uma mulher que, pouco a pouco, vai se livrando de pudores e tradicionalismos. É provável que poucas ou nenhuma das situações ali narradas aconteceria efetivamente com uma mulher Iraniana, entretanto, no campo do simbólico, é permitido construir uma narrativa de possibilidades que, na essência, dizem muito mais do que somos verdadeiramente no mundo.
Fotos: uma cortesia Reprodução Mostra SP para imprensa credenciada.
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