Por Cristiane Costa
Filmes sobre boxe como Touro Indomável (Raging Bull), de Martin Scorsese e Rocky, de Sylvester Stallone são referências clássicas quando a narrativa objetiva expor o drama, a superação e redenção de seus pugilistas. O arco dramático funciona da mesma forma, salvo casos em que o roteiro consegue se diferenciar por sua qualidade e inovação: o atleta advém de condição humilde e o boxe é seu talento e oportunidade de vencer na vida. Aos poucos, acumula vitórias, fica em evidência no desporto e na mídia e alcança boa condição financeira. Eis que há um adversário: um boxeador não carismático e de atitudes provocativas fora do ringue, que deseja revanche ou a chance de provar que é melhor que ele, além dos empresários ambiciosos, falsos ou aborrecedores que agem como urubus na carniça. De uma hora para outra, alguma situação dramática ocorre e joga o protagonista em uma espiral autodestrutiva, porém, através do esporte, ele supera as adversidades com força de vontade, treino e o apoio de um coach (técnico) que acredita nele. Chega o dia da grande luta, vários golpes jab, diretos e cruzados, muito sangue e a cara quebrada, emoções variadas e a vitória. Fim.
Nocaute (Soutphaw,2015), novo filme de Antoine Fuqua ("Dia de treinamento" e "O protetor") não foge à esta estrutura padrão de histórias sobre pugilismo. Kurt Sutter, experiente roteirista em TV norte americana com séries como "Sons of Anarchy" e "The Shield", estreia seu primeiro roteiro de longa-metragem e realiza um trabalho previsível, porém de apelo bastante sentimentalista, enfocando uma tragédia familiar e a superação e o amor de um boxeador para criar a filha. Jake Gyllenhall é Billy "The Great" Hope, lutador da categoria Peso Médio Junior dos Estados Unidos e conhecido por ter um poderoso golpe de esquerda. Billy tem a esposa Maureen (Rachel McAdams) como o seu principal pilar emocional. Pais de Leila (Onna Laurence), eles vivem muito bem em uma mansão e vivenciam o auge da vida abastada e da carreira. Até que ocorre uma trágica situação que dá um golpe bem mais doloroso e forte em Billy. A perda, a culpa e a decadência passam a fazer parte do seu dia a dia . Com a ajuda de Tick (Forest Whitaker), um ex-lutador de boxe e dono de uma academia na periferia, Billy retorna ao ringue para dar a volta por cima.
Este projeto tem uma referência metalinguística que serviu como base para a elaboração do roteiro e as escolhas da direção e que explica substancialmente como a produção começou: o filme O Campeão (1979) no qual o lutador Billy (Jon Voigt) tem que criar o filho sozinho e se dedica ao boxe como uma chance de ter um futuro melhor. Nocaute bebe desta fonte desde o início do projeto, mas também foi inspirado pela vida do rapper Eminem. Ele é um patrocinadores iniciais do longa e intérprete de "Kings never die", uma das canções da excelente trilha sonora. O astro pediu a Kurt Sutter para escrever uma história inspirada em "O Campeão". Como Sutter tem um estilo de roteirista mais original e que não deseja escrever remakes, ele realizou pequenas analogias entre o boxe e as experiências de Eminem com a paternidade, como a relação dele com a filha Hailie Jade, além do sofrimento de perder um dos seus melhores amigos de infância, o rapper Proof, morto em 2006. Com a saída de Eminem do projeto, Sutter e Fuqua mantiveram a mesma estrutura narrativa, porém deram uma roupagem mais universal e clássica, a do pugilista que busca a redenção. A bem da verdade é que, nada de efetivamente criativo ocorre em Nocaute . Seu genuíno chamariz tem apenas um nome: Jake Gyllenhaal.
Mais uma vez, Gyllenhaal destaca-se como um ator que agrega valor a qualquer produção cinematográfica, muito em virtude do seu instinto de superação a cada novo personagem e seu carisma. Aqui não é diferente e ele se esforça para dar dignidade e realismo ao papel. Embora o roteiro tente ao máximo dar profundidade psicológica ao personagem, o texto não ajuda e joga mais responsabilidade para Gyllenhaal dar dramaticidade à espiral descendente de Billy. Do começo ao fim do longa, cabe ao ator sustentar toda a narrativa com seu excelente preparo físico e habilidosa movimentação em cena. Para não tornar a atuação meramente visceral e esportista, Gyllenhaal doa-se emocionalmente às situações mais dilacerantes como a tragédia pessoal que catalisa a história e a conflitante e amorosa relação com a filha. Sem sombra de dúvida, este é um filme feito sob medida para emocionar o público assim como os filmes de Rocky. Em determinada parte do longa, resta à audiência sentir pena de Billy e torcer para que ele supere os maus momentos. Em alguma fase, qualquer pessoa perdeu o emprego, o dinheiro, "amigos", a casa, o equilíbrio psicológico e/ou as pessoas que amam, portanto, a história é facilmente aplicável e análoga a variadas experiências que criam um processo de identificação entre o público e o protagonista.
Nocaute é uma boa diversão para os fãs do boxe e de Gyllenhall, mas não espere o roteiro e direção de excelentes filmes contemporâneos como "O lutador" (The Wrestler)"e "Menina de Ouro" (Million Dollar Baby), respectivamente dirigidos por Darren Aronofsky e Clint Eastwood, que têm histórias que apelam menos para o sentimentalismo e conseguem subir o nível do drama pessoal através de uma direção que entrega menos as prováveis saídas do conflito e trabalha mais a psicologia do personagem. O roteiro de Nocaute é convencional, sentimental. Para torná-lo mais tradicional, Fuqua não é um bom diretor para dramas. Mesmo após a boa recepção de "Dia de Treinamento", um ponto fora da curva na sua filmografia, Fuqua não é de sutilezas. Destaca-se por filmes mais brutais, de força física em cena e movimentações de câmera que ressaltam truques explosivos de ação e em câmera lenta. Por conta disso, ele consegue realizar melhor as cenas que envolvem o treino e as lutas e, nas cenas mais dramáticas, não consegue a mesma eficácia e o protagonista tem que se virar. Apesar do seu estilo, Fuqua vem tentado dirigir filmes com um pouco mais de drama, sentimento e uma boa dose de redenção, como por exemplo, em "O protetor" no qual, apesar de Denzel Washington atuar como um máquina de matar, ele tem um carinho especial pela jovem garota de programa que tenta proteger.
Felizmente, Fuqua tem um elenco competente que dá conta do recado e, normalmente, trabalha com atores que têm grande capacidade de atuar com luz própria e poucas intervenções do diretor. McAdams dá um brilho solar e amoroso à história. Whitaker, um toque de disciplina, rigor e segunda chance em cada aparição. Laurence é uma garota esperta e madura. Gyllenhall prova que é um dos melhores atores de sua geração, principalmente em recentes trabalhos como "O homem duplicado" e "O Abutre". Dificilmente Nocaute lhe dará o tão merecido e esperado Oscar, ainda assim, é muito bom ver Gyllenhaal no ringue como se fosse um moderno Jake La Motta, um Rocky ou um Randy "The ram". É sempre convidativo ver um excelente ator dando umas porradas e pronto para mais um round.
Distribuição: Diamond Films
Olá! Obrigado pela resenha deste filme. Foi uma surpresa pra mim, já que foi uma historia muito criativa que usou elementos innovadores. Além o elenco foi bom. Para mim um dos filmes que Rachel McAdams fez mais interessantes que eu já vi. Realmente vale a pena todo o trabalho que a produção fez, cada detalhe faz que seja um grande filme. A verdade acho que é uma boa idéia fazer este tipo de adaptações cinematográficas. O filme superou as minhas expectativas, realmente o recomendo. Se vocês são amantes dos filmes desse atriz este é um filme que não devem deixar de ver.
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