Classificação do filme para faixa etária: 16+ anos
Por Cristiane Costa, Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação
O vencedor do Bafta 2014 de melhor estreia na direção, Kieran Evans, explorou a cidade de Liverpool, entre cenários urbanos e melancólicos assim como naturais e líricos, para realizar o drama de um amor jovem, transgressivo e trágico entre Kelly (Antonia Campbell-Hughes) e Victor (Julian Morris). Adaptação do romance de Niall Griffiths, a qualidade da direção transborda naturalidade em filmar o encontro de dois jovens solitários que, ao se conhecerem em uma balada e terem uma noite de sexo casual, passam a ter uma peculiar atração e desejo de descobrir a paixão e o prazer juntos, se arriscando a romper as barreiras do convencional.
A coerente apropriação de recursos espaciais e temporais pelo cineasta, bem como a competente direção de atores e espontaneidade ao dirigir perturbadoras cenas de sexo fazem a diferença. Pode-se afirmar veemente que o filme não entrou em um declínio narrativo em função de como o diretor soube equilibrar as dimensões controversas entre o tema e o roteiro, os perfis dos amantes e respectivas atuações e as cenas da cidade.
A narrativa tem variados aspectos líricos e intimistas como a mulher que está sozinha e com pensamentos distantes e misteriosos, mas também o homem que trabalha em uma rotina entediante e se sente bem quando está próximo à natureza e das memórias da amante. Nesse sentido, Kelly e Victor são como duas almas anônimas e solitárias que se encontram em um cotidiano realista e melancólico. Começam a ceder aos seus desejos sem necessariamente estarem focados no tipo de relação que ali se desenvolve. São duas almas que sentem a inadequação ao mundo e são impactados por ela em diferentes situações.
Assim, o sexo é um meio de comunicação entre eles. Apresenta-se na sua natureza mais visceral e libertadora, mostrando sua pulsão de vida e morte na história. Kelly é uma jovem mais discreta e madura que decide morar sozinha após uma separação conturbada, com um passado de violência doméstica. Victor é um jovem estilo bom moço. Bonito, gentil e de sorriso tímido, ele se sente muito atraído por Kelly e se permite ter uma experiência sexual mais selvagem. Tanto um como o outro tem a oportunidade de colocar para fora suas pulsões sexuais reveladoras. O sexo vem acompanhado por uma quebra de tradições, dando vazão à proximidade entre prazer e violência.
Mesmo em meio à complexidade da relação amorosa em um casal tão jovem e de personalidades bem diferentes, o longa garante boas cenas de flerte, confiança e cumplicidade. Algumas cenas mais fortes são dirigidas de uma forma rápida e exagerada, com alguns recortes abruptos, porém não chegam a comprometer a qualidade da direção. A trilha sonora indie-rock apresenta as emoções dos personagens com melancolia, escapismo e descoberta do amor. O final doloroso choca pelo imediatismo da finalização.
Ainda que seja trágico e obscuro, o filme traz as contradições do lirismo do amor e do sexo jovem. Estranhamente, tem aspectos leves e pesados, unindo essas duas pontas extremas bem amarradas por uma ótimas atuações e direção. A escolha por Antonia Campbell-Hughes e Julian Morris foi bem acertada. Ambos apresentam diferenças de personalidades e vivências. Ela teve experiências traumáticas que ele não teve e desconhece em grande parte da narrativa. Ele é mais ingênuo e romântico mas não menos sexual. Os dois conseguem encontrar um ponto de intersecção nos diálogos e na cama, fato que tem o lado prazeroso mas também destrutivo. Tudo depende até onde o fetiche controla a relação.
Kelly e Victor são como aquele casal escapista que poderia ter dado certo se o tempo assim o permitisse. Poderiam ter curtido mais as noites de Liverpool, a música que os aproxima e que substituiu as palavras que, muitas vezes, foram silenciadas ou não puderam ser ditas.
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