Por Cristiane Costa, Editora e crítica de Cinema MaDame Lumière e Especialista em Comunicação Empresarial
Adaptações de livros para o Cinema costumam agradar ao conciliar esses dois formatos em uma obra para entretenimento. Para quem ama Literatura, ficção e não ficção, ver a execução de um roteiro adaptado, inicialmente, desperta o interesse, posteriormente pode representar satisfação ou decepção. Independente de acertos ou erros nessa fusão criativa de Literatura e audiovisual, o Cinema é uma seara ampla e fértil para adaptações e nunca faltarão interessados, em especial quando se resgata um importante elemento de atração para esses filmes: a nostalgia.
Esse ano o diretor Carlo Milani lançou seu primeiro longa-metragem, "O Escaravelho do diabo", que foi aguardado exatamente por resgatar esse elemento nostálgico. É uma história bem conhecida no universo da Literatura infanto-juvenil no Brasil e vê-la na Tela Grande faz com que a memória afetiva volte à época do colégio, com as leituras recomendadas pela professora de português e trocadas entre amigos e as tardes silenciosas na biblioteca. A obra escrita pela jornalista Lúcia Machado Almeida é um clássico da emblemática coleção Vagalume da editora Ática, histórias que marcaram a adolescência de muitas gerações como "O rapto do garoto de ouro" e "O mistério do cinco estrelas".
Com adaptação da experiente roteirista Melanie Dimantas ("Meu pé de laranja lima") e de Ronaldo Santos, o filme reacende as lembranças dos primeiros livros de suspense que conciliavam um espírito de curiosidade, aventura, heroísmo e amizade na Literatura infanto-juvenil da Vagalume e, adiciona temas mais obscuros como a morte, a vingança e o bullying.
Na história, a cidadezinha de Vale das Flores vive um momento aterrorizante com a ação de um serial killer que utiliza um padrão peculiar: apenas pessoas ruivas são assassinadas. Antes de serem mortas, recebem uma caixinha com um escaravelho. O primeiro crime tem como vítima Hugo Maltese (Cirillo Luna), morto em ambiente doméstico e de forma muito abrupta e violenta. Seu irmão, o garoto Alberto Maltese (Thiago Rossetti), tomado por grande tristeza e senso de justiça decide investigar detalhes dos crimes e conta com o delegado Pimentel (Marcos Caruso).
Como obra audiovisual, além do resgaste da nostalgia , o filme acerta em criar uma obra que mescla bem a violência com uma certa leveza narrativa. Existe uma fotografia que ressalta a faceta cult da obra, com a beleza dos personagens ruivos, as referências do horror com o uso de insetos e de um serial killer deformado e misterioso, mas também é possível observar que há o desabrochar do personagem Alberto Maltese, um jovem carismático, amoroso e corajoso que está disposto a defender sua família, amigos e comunidade.
Não se pode esquecer que essa é uma obra infanto-juvenil que, ainda hoje, é lida por adolescentes. É claro que o jovem moderno não é mais inocente ainda que o filme preserve a ingenuidade, a docilidade de Alberto. O adolescente atual está acostumado a ver filmes violentos de super heróis, suspenses de ação, aventuras macabras, entre outros, mesmo assim, o diretor insistiu em preservar um approach ingênuo e curioso no jovem. Assim, a marca forte de "O escaravelho do diabo" é seu valor literário como obra que guarda uma combinação de inocência com o revelar de um mundo brutal. Sim, as crianças também são violentas e cometem erros com os seus coleguinhas! Só que essa violência psicológica é sutil no filme porque ela cresce na figura do que o assassino representa: um adulto brutal e vingativo com traumas passados, ou seja, uma criança que se tornou um ser humano ruim.
Embora o roteiro tenha mantido essa suavidade narrativa e é bem apoiado na execução pela fotografia de Pedro Farkas e a direção de arte de Valdy Lopes que retratam muito bem esse ambiente interiorano de Vale das Flores e a variedade na forma que as mortes acontecem, suportada por referências visuais do gênero horror/suspense, o filme não é nem apaixonante e nem intenso nas emoções dos personagens. A violência está lá, só que ela é mais plástica e desencadeada por uma sucessão de eventos que, em si, não vão entregar um intrigante processo de investigação e muito menos uma arrebatadora aventura juvenil. Por conta disso, o último ato é concluído de maneira apressada, os personagens não são bem desenvolvidos e o ritmo é lento.
É um filme visualmente bem produzido, que é fiel às virtudes citadas e tem um toque de humor, entretanto, a direção opta por não torná-lo muito obscuro, emocional. Ela foi conservadora e realiza um filme mais direcionado para o público de pré-adolescentes ou para resgatar a memória afetiva de quem leu o livro na adolescência. Opta por preservá-lo como uma brincadeira juvenil, uma ficção que só encontra a sua melhor manifestação nas aventuras imaginárias de uma leitura.
Lembro-me muito bem da série vagalume. Lia este e "Os Assassinatos da Rua Morgue", de Edgar Allan Poe, de outra série de livros, na mesma época da escola. Saudades deste tempo. Ainda preciso conferir o filme, Cris, uma pena que é apenas okay. E você diz que a direção foi conservadora. Ademais, é bem produzido. Menos mal...cinema é transmutação, quem espera fidelidade ao pé da letra, não entende e se frustra. O grande problema do público perante filmes adaptados.
ResponderExcluirBelo texto.
Bjos.
Curator, obrigada pela visita. O filme tem uma pegada cool. Em termos de cinematografia, tem um mood bem adequado a uma história juvenil e com essa missão de despertar a memória afetiva. Uma diversão leve! Acredito que nem toda adaptação precisa ser ao pé da letra.
ExcluirBeijos!