Tudo começa quando o Papa falece e precisa de um sucessor. De acordo com as regras seguidas pelo conclase, o novo Papa é escolhido em uma eleição entre os cardeais do Vaticano. Já nos primeiros minutos, entre um tom solene e de humor levemente "pecaminoso", acompanhamos a câmera evidenciando o comportamento dos cardeais, que não querem ser o escolhido. Surgem os fluxos de consciência: “Por favor, Senhor, não, não quero que seja eu!”, e também planos bem engraçados, como o que filma os rostos curiosos de alguns bisbilhotando os votos dos colegas. É impossível não dar risada de como o supra cargo do Vaticano não é nenhum pouco desejado, como se fosse a porta de entrada para carregar uma cruz ou entrar no inferno. As primeiras sequências evidenciam o tom bem humorado da comédia e criam um vínculo carismático entre o público e os cardeais, de todas as origens possíveis, da América do Sul a Oceania, cada um tem uma característica que os aproxima da humanidade falha de todo ser humano, desde o que fuma até o que toma ansiolíticos ou tem conturbados pesadelos durante a noite. Essa conexão com o elenco de cardeais, e principalmente, com Michel Piccoli, em excelente atuação que mescla um vazio existencial com uma postura inerte a qualquer decisão, torna "Habemus Papam" uma diversão levemente sarcástica que, de forma descontraída, faz a audiência refletir que todos têm problemas em suas terrenas existências. Até mesmo o Papa pode ter uma crise de pânico, ir a um consultório psicológico e tomar antidepressivos. De fato, ser um líder religioso, ainda que em alta posição na Igreja, deveria ser uma forma de se aproximar das pessoas, de seus medos, anseios e aflições. Nesse ponto, o filme é um ótimo exercício de humanidade.
A direção tende a ser mais revigorante do que o roteiro e promove uma melhor aproximação com o elenco de coadjuvantes, desde observá-los jogando cartas até um jogo de voleibol. Nessa última, os movimentos chegam a ser como uma dança visual, com caras e bocas dos cardeais e freiras, que também têm direito a uma diversão. Tudo tem uma pitada de charme sacro com risadas profanas, a começar também com o papel do cineasta Moretti, que é o psicanalista ateu que vem para agregar um elemento externo, que estabelece uma relação mais próxima com cardeais, que também estão proibidos de saírem nos arredores da Praça São Pedro até que o Papa decida se apresentar os fiéis. São seres enclausurados, mas que continuam vivendo suas vidas com defeitos.Se por um lado o elenco é agradável e a temática pode ser aplicada a qualquer situação, no qual a depressão está acima da vontade e, que a decisão pela melhor escolha cabe a cada um; por outro lado, o roteiro peca ao não amarrar muito bem a narrativa com o drama do Papa e o quanto isso poderia ser existencialmente profundo para contar uma história desse calibre. Nanni Moretti opta pela simplicidade de uma comédia ligeira, sem hiperbólicas reflexões sobre a responsabilidade de se tomar uma decisão qualquer, principalmente a eclesiástica. Tomando posse de um papel dramático-cômico, o ótimo Michel Piccoli se torna o melhor a ser apreciado. O Papa perambula pela cidade, retoma contato com o teatro, uma de suas paixões, discute muito pouco com o público sua fé e o peso do caminho religioso que decidiu seguir, ainda assim, contemplar o ator é um bel prazer. Portanto, "Habemus Papam" é um filme mais degustativo e merece ser visto para entreter-se com a simpatia que ele certamente tem. Ele também faz o público perceber que todos, independente do cargo e da posição que exercem, têm o direito ao sim e ao não.
Habemus é bacana sim. Porém, apesar do ritmo agradável e das gags eficientes, o filme se perde nisso, esquecendo de aprofundar-se no drama do Papa. Além disso, Nanni Moretti soa deslocado e parece querer empurrar seu personagem no espectador, visto que ele tem pouca função narrativa - sua esposa então... Não só isso, mas o longa possui inúmeras sequências que, narrativamente, são descartáveis - a do vôlei, por exemplo. Ainda sim, é um bom filme, com o Michel Piccoli dando show!
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