Sou MaDame Lumière. Cinema é o meu Luxo.

  Acompanhante Perfeita: O Terror da Solidão e da Misoginia na Era da IA #FicçãoCientífica #Violênciadegênero #Terror #Horror #Thrillerpsico...

Acompanhante Perfeita (Companion, 2025)

 



Acompanhante Perfeita: O Terror da Solidão e da Misoginia na Era da IA



#FicçãoCientífica #Violênciadegênero #Terror #Horror #Thrillerpsicológico #Suspense #Críticasocial #Streaming


Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação

 


A combinação da ficção científica com o horror funciona como um inigualável instrumento para construir histórias que tocam em temas nevrálgicos e urgentes em nossa sociedade atual, imersa em avanços tecnológicos, relações fracassadas e frustrações humanas. "Acompanhante Perfeita" (Companion, 2025), com direção do americano Drew Hancock, demonstra claramente que a mistura de solidão, amores líquidos, ambição e tecnologia é uma combinação explosiva, capaz de aterrorizar os corações mais crentes no amor.










Na narrativa, o solitário Josh (Jack Quaid) decide adquirir uma robô como acompanhante perfeita. Autêntica em sua singularidade, Iris, interpretada por Sophie Thatcher, é programada para se apaixonar e agir servilmente ao seu "amado". Tudo é milimetricamente controlado pelo celular: Josh pode configurar o que desejar, inclusive o nível de inteligência da robô. Paulatinamente, o público percebe que Josh não é um homem ingênuo; pelo contrário, revela-se cruel, ambicioso e, definitivamente, sem caráter. Sua solidão é exposta da pior forma: a de alguém que não tem escrúpulos morais nem para tratar sua robô com respeito, em suma, um homem incapaz de estabelecer relações verdadeiras.









Mesclando horror, comédia e suspense, o longa assemelha-se a um episódio estendido da série Black Mirror, ao retratar a tecnologia sendo utilizada e subestimada pelo ser humano e sua intrínseca arrogância. Nesse caso, pessoas podem ser mais perigosas do que máquinas. Fica ainda mais evidente que o problema não reside na tecnologia em si, mas em como o ser humano a projeta e a manipula. No caso de Josh, ao lado de seus amigos em uma cabana no campo, a violência contra os robôs é contínua, tanto física como psicológica. Com planos premeditados para enganar o ricaço Sergey (Rupert Friend), Josh e sua amiga Kat (Megan Suri) não demonstram nenhuma piedade por Iris. A partir desse ponto, começam cenas bastante carregadas de humor ácido e sangue, desmascarando suas índoles.









Para além dos interesses escusos dos amigos, uma das melhores camadas do longa reside na constatação de que não haverá acompanhantes perfeitas para homens como Josh. São homens que usam a mulher ao seu bel-prazer sexual, revelando inseguranças patéticas. Homens com baixa autoestima, irresponsáveis afetivos e incapazes de estabelecer laços verdadeiros. Ainda que seja uma robô, ela mereceria ser tratada com uma consideração consciente. No entanto, Josh é a expressão grotesca de um homem misógino.




Sophie Thatcher, em seu cativante papel de Iris, é uma atriz que se encaixa perfeitamente na atmosfera de horror com ficção científica. Ela encarna aquela figura "esquisita e legal" que carrega uma autenticidade formidável, o que gera uma torcida absoluta para sua personagem – a ponto de desejarmos que ela se vingue perfeitamente de mais um misógino desnecessário no mundo. Outro aspecto relevante na narrativa é a sutil inclusão de que, por trás da tecnologia, e em uma visão mais ficcional, a máquina se mostra mais humanizada do que o próprio ser humano. Com isso, essa crítica não se baseia em devaneios, mas em constatações perspicazes. De fato, até mesmo ao conversar com uma inteligência artificial, ela demonstra mais respeito e colaboração do que muitas interações humanas.










Assim, Iris, como acompanhante perfeita, revela-se verdadeiramente espetacular, pois a confiança e os limites estabelecidos pelo uso da tecnologia são levados a sério pela robô. Em contrapartida, o ser humano, na figura de Josh, age sem escrúpulos, o que o estabelece como um desses seres humanos desprezíveis, que não merecem compaixão por se esconderem por trás de sua própria covardia.




(3,5)




0 comments:

Caro (a) leitor(a)

Obrigada pelo seu interesse em comentar no MaDame Lumiére. Sua participação é muito importante para trocarmos percepções e opiniões sobre a fascinante Sétima Arte.

Madame Lumière é um blog engajado e democrático, logo você é livre para elogiar ou criticar o filme assim como qualquer comentário dentro do assunto cinema e audiovisual.

No entanto, não serão aprovadas mensagens que insultem, difamem ou desrespeitem a autora do blog assim como qualquer ataque pessoal ofensivo a leitores do blog e suas opiniões. Também não serão aceitos comentários com propósitos propagandistas, obscenos, persecutórios, racistas, etc.

Caso não concorde com a opinião cinéfila de alguém, saiba como respondê-la educadamente, de forma a todos aprenderem juntos com esta magnífica arte. Opiniões distintas são bem vindas e enriquecem a discussão.

Saudações cinéfilas,

Cristiane Costa, MaDame Lumière

  #FicçãoCientífica #Distopia #Ação #Críticasocial #Streaming Por  Cristiane Costa ,  Editora e blogueira crítica de Cinema, e specialista e...

O Preço do Amanhã (In Time, 2011)

 



#FicçãoCientífica #Distopia #Ação #Críticasocial #Streaming


Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação

 



As transformações sociais, políticas, tecnológicas e comportamentais que testemunhamos ecoam, de forma crescente, as premissas de um futuro distópico em desenvolvimento. A indignação diante das atrocidades e da fragilidade da moral humana já não surpreende, encontrando ressonância em obras como "A Sociedade do Cansaço" de Byung-Chul Han e nas narrativas perturbadoras de "Black Mirror".




Em "O Preço do Amanhã" (In Time, 2011), sob a direção de Andrew Niccol, somos confrontados com uma distopia que perspicazmente antecipava a exacerbação da divisão de classes: uma elite privilegiada, detentora dos bens de produção, do poder e do capital. Em contrapartida, uma vasta parcela da população é subjugada à venda de sua força de trabalho em condições laborais cada vez mais precárias e salários irrisórios. Em um futuro onde o envelhecimento cessa aos 25 anos, a sobrevivência se torna dependente da aquisição de tempo, sob a constante ameaça da expiração.









A premissa central expõe a cruel realidade de que o tempo, a própria essência da vida, é um bem inacessível aos desfavorecidos. Enquanto os abastados usufruem da promessa de uma juventude eterna com inegável qualidade de vida, os despossuídos lutam contra o aprisionamento em subempregos degradantes, a violência de criminosos que roubam instantes vitais e a vigilância opressiva de "guardiões do tempo" incumbidos de manter a ordem de uma injustiça institucionalizada.





Nesse cenário sombrio, Will Salas, interpretado com um carisma magnético por Justin Timberlake em seu auge, emerge como um indivíduo bonito, de origem humilde e dotado de uma coragem intrépida. A trágica perda de sua mãe (Olivia Wilde) o impulsiona a buscar vingança contra um sistema implacável. Inicialmente, Will parece alheio ao seu potencial como agente de transformação coletiva, mas seu destino se entrelaça ao de Sylvia Weis (Amanda Seyfried), a filha de um magnata com espírito contestador. Juntos, tornam-se alvos da implacável perseguição de Raymond Leon (Cillian Murphy), o zeloso executor da lei do tempo, e de Fortis (Alex Pettyfer), o impiedoso líder de uma gangue de ladrões de vida.










A dinâmica entre Timberlake e Seyfried em cena confere energia à narrativa, impulsionando a ação com uma química convincente. Contudo, é Timberlake quem assume o protagonismo, transformando seu personagem em uma figura que evoca um Robin Hood distópico, roubando tempo da elite como um ato de rebelião e buscando meios de garantir a sobrevivência daqueles à margem do sistema. Considerando a notoriedade de Timberlake como astro da música e sua crescente incursão no cinema à época, é pertinente ponderar se sua participação neste projeto visava mais a consolidação de sua imagem pública do que uma profunda imersão na arte dramática. Ainda assim, seu inegável carisma contribui para a vitalidade da narrativa.





Apesar do ritmo frenético da ação e da trama de perseguição, o mérito essencial desta distopia reside em sua perturbadora atualidade. Embora a narrativa não se aprofunde exaustivamente na crítica social, a premissa central ressoa com uma verdade incômoda: na prática, uma parcela significativa da população, incluindo a classe trabalhadora e a classe média, aliena seu tempo e energia vital em troca da subsistência. E essa transação impõe um preço elevado, o preço de uma esperança cada vez mais tênue em um futuro incerto. A criatividade do roteiro reside em transmutar uma dinâmica intrínseca ao sistema capitalista em uma lei distópica de vida ou morte: a ausência de "créditos de tempo" acarreta a extinção.









Essa premissa espelha a realidade contemporânea, marcada por uma distribuição de renda desigual, fundamentada na exploração e na manutenção de um status quo que perpetua os privilégios de uma minoria. Embora a busca por uma vida confortável e próspera seja legítima, ela se torna questionável quando construída sobre a privação e o sofrimento de muitos. A equidade ideal permanece uma utopia distante, pois a acumulação de riqueza por alguns frequentemente se concretiza à custa da miséria de outros. "O Preço do Amanhã", portanto, transcende a mera ficção, atuando como um espelho crítico de nossas próprias desigualdades e um chamado à reflexão sobre um sistema que precifica a própria existência.





(3,5)


0 comments:

Caro (a) leitor(a)

Obrigada pelo seu interesse em comentar no MaDame Lumiére. Sua participação é muito importante para trocarmos percepções e opiniões sobre a fascinante Sétima Arte.

Madame Lumière é um blog engajado e democrático, logo você é livre para elogiar ou criticar o filme assim como qualquer comentário dentro do assunto cinema e audiovisual.

No entanto, não serão aprovadas mensagens que insultem, difamem ou desrespeitem a autora do blog assim como qualquer ataque pessoal ofensivo a leitores do blog e suas opiniões. Também não serão aceitos comentários com propósitos propagandistas, obscenos, persecutórios, racistas, etc.

Caso não concorde com a opinião cinéfila de alguém, saiba como respondê-la educadamente, de forma a todos aprenderem juntos com esta magnífica arte. Opiniões distintas são bem vindas e enriquecem a discussão.

Saudações cinéfilas,

Cristiane Costa, MaDame Lumière

  #Comédia #Ação #CinemaAsiático #CinemaChinês #historiasdedetetive #Blockbuster Distribuição Sato Company . Estreia 15 de maio. Em cartaz. ...

Detetive Chinatown: O Mistério de 1900

 



#Comédia #Ação #CinemaAsiático #CinemaChinês #historiasdedetetive

#Blockbuster


Distribuição Sato Company. Estreia 15 de maio. Em cartaz.


Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação

 



A franquia de comédia e mistério "Detetive Chinatown" teve início em 2015, apresentando a inusitada parceria entre Qin Feng, um aspirante a policial, e seu excêntrico "tio" Tang Ren, um suposto detetive de Chinatown em Bangkok. Essa dupla peculiar logo se aventura em casos complexos que os levam por destinos vibrantes, como Nova York e Tóquio, nas sequências de 2018 e 2021.








No cinema contemporâneo, é crucial expandir nossos horizontes para além dos circuitos já consolidados de festivais artísticos e independentes, abrindo espaço para novas produções de regiões como a Ásia e a África. Isso se torna ainda mais relevante quando essas obras buscam se aproximar de um público mais amplo com propostas comerciais. A franquia "Detetive Chinatown" é um exemplo vibrante disso. Ela entrega uma verdadeira miscelânea de gêneros – comédia, ação, investigação, um toque de romance e suspense –, que, mesmo em meio ao caos narrativo, consegue resultar num filme despretensioso e genuinamente engraçado. Há um certo toque nonsense que serve como um alívio bem-vindo, desfazendo a pressão por grandes espetáculos cinematográficos e convidando o espectador a simplesmente se divertir.







Chow Yun Fat: queridíssimo no Cinema, e de volta à cena!





Avançando para a trama de DETETIVE CHINATOWN: O MISTÉRIO DE 1900, somos transportados para a virada do século XIX para o XX, na vibrante São Francisco, nos EUA. Lá, o assassinato da filha de um congressista joga o distrito de Chinatown numa turbulência social, servindo como o ponto de partida perfeito para mais uma aventura da franquia. Prepare-se, pois o filme mantém aquele tom característico, mesclando humor e investigação de maneira eficaz, com um novo mistério cheio de pistas escondidas e reviravoltas capazes de prender qualquer um — o que, cá entre nós, funciona ainda melhor na imersão da tela grande!






 John Cusack: oposição aos Chineses nos USA





Para essa nova empreitada, a franquia inova ao trazer seus protagonistas, Wang Baoqiang e Liu Haoran, em papéis inéditos, mostrando a versatilidade desse elenco majoritariamente chinês. Wang interpreta Ah Gui, um caçador criado por uma tribo indígena, movido pela vingança após a morte de seu pai adotivo. Já Liu vive Qin Fu, um médico tradicional chinês e tradutor, cuja lógica afiada e conhecimento médico são cruciais para desvendar o assassinato em São Francisco. A investigação ainda ganha peso com a presença de Bai Xuanling, vivido pelo lendário Chow Yun-Fat (O Tigre e o Dragão), cujo filho é suspeito do crime, e do renomado John Cusack (Quero Ser John Malkovich) como o congressista Grant, marcando sua segunda parceria com o diretor Chen Sicheng. É um elenco de peso que promete entregar diversão e mistério na medida certa!





Zhang Xincheng: o romântico que se apaixona por uma Americana




No que diz respeito ao entretenimento, o filme é uma verdadeira salada mista, entregando um delicioso caos de ação e cenas hilárias. O que é particularmente interessante é como ele consegue, de forma despretensiosa, desconstruir aquele estereótipo do asiático excessivamente discreto, revelando personagens simpáticos e com uma naturalidade que, por vezes, força um pouquinho a barra do humor no roteiro, mas sempre num tom brincalhão que não pesa na experiência. É um humor leve, que alivia o estresse e a cobrança por grandes espetáculos cinematográficos.




Essa "salada mista" vai além, abraçando diversas referências entre Oriente e Ocidente. O filme se destaca por um investimento grandioso na cenografia de época, com uma direção de arte e figurino extravagantes que mesclam heranças europeias, asiáticas e americanas. Tudo isso transforma a projeção numa grande brincadeira de investigação e, ao mesmo tempo, uma voz pela justiça dos injustiçados e excluídos. Assim, temáticas tão delicadas quanto xenofobia e a intolerância entre povos ganham uma dimensão mais referencial, convidando o público a refletir sobre a importância do respeito e da aceitação mútua.







Liu Haoran e Wang Baogiang: parceria inusitada que deu certo!




Embora a narrativa se incline para a ação frenética e as viradas mirabolantes, Detetive Chinatown: O Mistério de 1900 é um blockbuster que promete agradar quem não julga um filme apenas pela capa e busca simplesmente passar o tempo sem grandes exigências cinematográficas. Uma parte considerável do humor do longa, e por consequência da atenção que ele prende, vem do ator Wang Baoqiang. Ele domina as artes marciais e traz um estilo que mistura a agilidade de um Jackie Chan com uma ascendência que, no filme, parece ter raízes chinesas e indígenas, além de poderes quase surreais para a investigação. E sim, pode parecer um exagero na concepção do personagem, mas o filme não tem medo de ser politicamente incorreto em certas cenas, e sua participação é, sem dúvida, o grande chamariz da produção.




(2,5)




Fotos cedidas por Assessoria de imprensa para crítica do filme.

0 comments:

Caro (a) leitor(a)

Obrigada pelo seu interesse em comentar no MaDame Lumiére. Sua participação é muito importante para trocarmos percepções e opiniões sobre a fascinante Sétima Arte.

Madame Lumière é um blog engajado e democrático, logo você é livre para elogiar ou criticar o filme assim como qualquer comentário dentro do assunto cinema e audiovisual.

No entanto, não serão aprovadas mensagens que insultem, difamem ou desrespeitem a autora do blog assim como qualquer ataque pessoal ofensivo a leitores do blog e suas opiniões. Também não serão aceitos comentários com propósitos propagandistas, obscenos, persecutórios, racistas, etc.

Caso não concorde com a opinião cinéfila de alguém, saiba como respondê-la educadamente, de forma a todos aprenderem juntos com esta magnífica arte. Opiniões distintas são bem vindas e enriquecem a discussão.

Saudações cinéfilas,

Cristiane Costa, MaDame Lumière

  Lispectorante (2024): Entre o Sonho e a Realidade Feminina Em cartaz no  IMS Paulista - SP #Drama #CinemaBrasileiro #Literatura #ClariceLi...

Lispectorante (2024)

 


Lispectorante (2024): Entre o Sonho e a Realidade Feminina


Em cartaz no IMS Paulista - SP


#Drama #CinemaBrasileiro #Literatura #ClariceLispector


Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação

 



Como espectadores, há momentos em que filmes, apesar de ideias promissoras, atores talentosos e uma equipe dedicada, nos deixam com a sensação de que algo na execução se perdeu. Isso acontece, por vezes, quando tentativas oníricas não conseguem se ancorar nas experiências práticas da vida. É uma sensação que Lispectorante (2024) pode evocar. O drama, dirigido por Renata Pinheiro, traz a mais do que especial Marcélia Cartaxo no papel de Gloria Hartman, uma mulher de meia-idade.








Distribuído pela Embaúba Filmes, o longa da diretora pernambucana oferece uma perspectiva feminina sobre o amadurecimento. Ele aborda os desafios da longevidade: a solidão, a carreira e a morte. Nesse contexto, a figura de Clarice Lispector e o casarão em seu nome inspiram a protagonista a viver dias que oscilam entre a esperança dos sonhos e a dura realidade da mulher pós-40 no Brasil.



Gloria Hartman, uma referência ao livro A Paixão Segundo G.H., é um mergulho literário na alma feminina que precisa lidar com as interrogações de um cotidiano ordinário e nem sempre palatável. Com a experiência de Marcela Cartaxo, Gloria demonstra uma humildade e gentileza que tocam o público. No entanto, ao percebemos sua realidade — divorciada, com uma carreira de altos e baixos e dificuldades financeiras —, os sonhos se revelam uma fuga necessária.








Nesse sentido, Lispectorante pode ser percebido como um "shot onírico" que se estende por 93 minutos. Apesar das ótimas ideias, sua execução nem sempre é acessível a todos. A materialização dos planos se mostra itinerante, dificultando que o filme alcance a inventividade e o lirismo de Clarice Lispector de forma mais palpável, o que gera opiniões divididas. Em vez de explorar as referências lispectorianas com uma lógica mais clara, o drama ecoa mais nas camadas visuais de um escapismo — possivelmente uma crise de meia-idade —, com planos que se inclinam mais ao caótico do que ao afetivo, nem sempre promovendo uma catarse emocional efetiva.




Em qualquer adaptação literária, é relevante considerar uma dose de mímesis ou uma releitura clássica que permita ao público conectar-se com as referências. Aqui, há boas intenções partindo das ruínas do casarão de Clarice em Recife. Contudo, a mera presença dessas ruínas, que marcam o tempo com o qual uma mulher como Gloria não consegue lidar, pode não ser suficiente para construir uma narrativa que realmente envolva o público geral.








De forma ampla, Lispectorante utiliza a obra de Clarice Lispector mais como uma ambientação onírica e uma inspiração subjetiva. Isso pode fazer com que alguns espectadores se identifiquem, enquanto outros podem sentir que a presença da escritora foi menos evidente do que o esperado. É fundamental que a arte, mesmo ao explorar a subjetividade, conecte-se com o que é mais humano: a compreensão do ser. Em Lispectorante, a experimentação parece preponderar sobre a memória, e no caso de Clarice Lispector, a memória é questão de identidade — um aspecto que poderia ter sido mais explorado no filme.







Fotos cedidas pela assessoria do filme para crítica do longa.

0 comments:

Caro (a) leitor(a)

Obrigada pelo seu interesse em comentar no MaDame Lumiére. Sua participação é muito importante para trocarmos percepções e opiniões sobre a fascinante Sétima Arte.

Madame Lumière é um blog engajado e democrático, logo você é livre para elogiar ou criticar o filme assim como qualquer comentário dentro do assunto cinema e audiovisual.

No entanto, não serão aprovadas mensagens que insultem, difamem ou desrespeitem a autora do blog assim como qualquer ataque pessoal ofensivo a leitores do blog e suas opiniões. Também não serão aceitos comentários com propósitos propagandistas, obscenos, persecutórios, racistas, etc.

Caso não concorde com a opinião cinéfila de alguém, saiba como respondê-la educadamente, de forma a todos aprenderem juntos com esta magnífica arte. Opiniões distintas são bem vindas e enriquecem a discussão.

Saudações cinéfilas,

Cristiane Costa, MaDame Lumière

  Quando o amanhã morre: um drama atemporal de Larry Kent Disponível na plataforma Filmicca   #Drama #CinemaCanadense #dicasstreaming #Filmi...

Quando o amanhã morre (When tomorrow dies, 1965)

 

Quando o amanhã morre: um drama atemporal de Larry Kent

Disponível na plataforma Filmicca 


#Drama #CinemaCanadense #dicasstreaming #Filmicca #TrilogiadeVancouver #LarryKent 


Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação

 


Um drama sobre uma mulher casada, exausta da vida doméstica e de um marido focado apenas na carreira, é um tema muito bem-vindo para a reflexão sobre as diferenças de gênero no cinema. É impressionante como, passados 60 anos de sua produção, Quando o Amanhã Morre (1965), de Larry Kent, permanece bastante contemporâneo, especialmente diante do peso dos diversos papéis sociais que uma mulher desempenha e da crise da instituição do casamento, cada vez mais abalada por inúmeros divórcios.





Esposa e marido em um relacionamento rotineiro e entediante



Interpretada com excelência pela atriz escocesa Patricia Gage, o drama gira em torno do cotidiano de Gwen James, mãe de duas filhas e casada com Doug James (Douglas Campbell). Com um pai doente em uma casa de repouso, Gwen é a expressão da mulher que abdicou dos estudos e do trabalho para se dedicar integralmente à família, dependente economicamente do marido. Comportamentalmente, ela se sente entediada e frustrada: as filhas pouco ajudam nos afazeres domésticos, o marido só pensa em produzir e ganhar dinheiro, e a vida sexual não se aproxima de carinhos autênticos.









Com um texto objetivo e de muita personalidade, Gwen vai se libertando, aos poucos, dessa "escravidão" domiciliar. Ela atinge o limite em que a vida familiar se torna um peso, por mais que ainda ame a prole e o marido. Mas será que é amor? Um casamento sobrevive à falta de conquista diária? Os rituais cotidianos se transformam em um fardo? Quando o Amanhã Morre é sobre a alma feminina no legítimo momento do tédio e da necessidade de libertação.












Nesse contexto, Gwen volta aos estudos e conhece o professor Patrick Trevelyan, interpretado por Neil Dainard. Um novo mundo se abre, altamente atrativo e sedutor, afinal, o conhecimento também é um afrodisíaco. Além de sua inteligência, ele é aquele mestre que, a princípio, parece inofensivo e um tanto desligado. No entanto, aos poucos, eles começam a desenvolver algo raro no casamento de Gwen: o diálogo.






Mulheres costumam gostar de homens que escutam e que as fazem rir. Quando essa combinação misteriosa de escuta ativa com bom humor acontece, elas se encantam, já que é muito raro um homem se comunicar adequadamente ao longo de décadas. Na modernidade das relações líquidas, o ato de conquista a cada flerte, como um ritual harmônico de atenção e descoberta, é algo incomum.






Neil Dainard: o professor




Assim, em plenos anos 60, a troca de olhares entre aluna e professor resgata Gwen desse dia a dia entediante com seu marido. Não é sobre um fetiche, mas sobre a liberdade de ser mulher e ser enxergada por um homem. O problema das relações é a invisibilidade do outro, principalmente em casamentos que se tornam fachadas ou entram em decadência.






O poder desse drama reside em sua capacidade de ser honesto com a solidão da mulher ignorada pelo marido e que tem filhos mimados e imaturos. Gwen está sozinha, como muitas outras mulheres no mundo. A diferença é que ela ousa ter um período de estudos e conhecer outro homem — não necessariamente uma "traição relâmpago", mas uma forma de exercer os desejos de seu feminino e a capacidade de se comunicar com outro sexo, com gentileza e sem uma sexualização urgente e lugar-comum.






A câmera de Larry Kent praticamente flerta com a beleza elegante de Patricia Gage e seu ímpeto em enfrentar a família, expressando tanto seu poder magnético de ser muito mais do que uma dona de casa, mas também uma mulher dona de si. Os close-ups demonstram o potencial emancipatório dessa mulher dos anos 60.







Patricia Gage: Esposa em questionamento da vida convencional





Essa década foi marcada por uma necessidade de desafiar os papéis sociais, com o ingresso das mulheres no mercado de trabalho e maior participação ativa. Embora Gwen não trabalhe em uma empresa no longa, sua iniciativa de voltar à universidade é a base para uma possível alavancagem. No Canadá, considerando o contexto local das conquistas de gênero, as mulheres haviam obtido o direito ao voto e a abrir contas em bancos sem a assinatura de seus respectivos esposos, além do desenvolvimento de medidas contraceptivas e da busca por equidade pelo movimento feminista.






Com base nessa constatação histórica, o belíssimo filme de Larry Kent lança um olhar já disruptivo sobre a mulher canadense, que ressoa no mundo, considerando o ativismo social e político das mulheres e a busca por experiências mais participativas na sociedade. Ainda que o diretor foque nas relações interpessoais de Gwen com a família e seu professor, fica claro o tom libertador dessa mulher. Tanto que, no desfecho, como em um sonho premonitório, ela evolui consideravelmente ao recusar uma possível vida convencional. A partir desse final ambíguo e impactante, os espectadores podem refletir sobre o peso das prisões nas relações tradicionais que, na maioria das vezes, são hipócritas e só trazem a infelicidade disfarçada de status social.









0 comments:

Caro (a) leitor(a)

Obrigada pelo seu interesse em comentar no MaDame Lumiére. Sua participação é muito importante para trocarmos percepções e opiniões sobre a fascinante Sétima Arte.

Madame Lumière é um blog engajado e democrático, logo você é livre para elogiar ou criticar o filme assim como qualquer comentário dentro do assunto cinema e audiovisual.

No entanto, não serão aprovadas mensagens que insultem, difamem ou desrespeitem a autora do blog assim como qualquer ataque pessoal ofensivo a leitores do blog e suas opiniões. Também não serão aceitos comentários com propósitos propagandistas, obscenos, persecutórios, racistas, etc.

Caso não concorde com a opinião cinéfila de alguém, saiba como respondê-la educadamente, de forma a todos aprenderem juntos com esta magnífica arte. Opiniões distintas são bem vindas e enriquecem a discussão.

Saudações cinéfilas,

Cristiane Costa, MaDame Lumière

  Horror psicológico Dinamarquês apresenta um final seco e cruel e escancara a psicopatia dos anfitriões de uma família #horror #terrorpsico...

Não fale o mal (Gæsterne, 2022)

 




Horror psicológico Dinamarquês apresenta um final seco e cruel e escancara a psicopatia dos anfitriões de uma família


#horror #terrorpsicológico #suspense #drama #mistério #dicasstreaming #CinemaEscandinavo #CinemaEuropeu



Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação

 



O terror psicológico em toda sua força narrativa tem um carater revelador de transformar ameaças, medos e paranoias em experiências dilacerantes pelas quais nem mesmo o ser humano mais pessimista esperaria. Mais dilacerante do que lidar com esses elementos assustadores ocorre quando o perigo vem daqueles que dissimulam uma pseudo simpatia, demonstrando que os piores pesadelos convertidos em realidade podem ser conhecidos, amigos e/ou familiares. É o que acontece no longa-metragem Dinamarquês Não fale o mal (Speak no Evil/ Gæsterne, 2022) dirigido por Christian Tafdrup.












O roteiro mostra duas famílias que se encontram em uma viagem à Toscana: uma Holandesa com o pai Patrick (Fedja van Huêt), a mãe  Karin (Karina Smulders) e o filho Abel (Marius Damslev), e a Dinamarquesa formada pelo pai Bjorn (Morten Burian), a mãe Louise (Sidsel  Siem Koch) e a filha Agnes (Lisa Forsberg). Na ensolarada e inspiradora cidade, as famílias se conhecem e o convidativo espírito de férias e diversão coopera para deixar o momento agradável e promissor. Como a maioria das viagens, as pessoas estão abertas a ser hospitaleiros uns com os outros e fazer amizades. Daí nasce uma potencial amizade.












Após um período, o surpreendente acontece: surge um convite para que a família Dinamarquesa viaje para a casa de campo dos holandeses. Um convite com possibilidade de quebrar a rotina, conectar-se com outro país e cultura, estreitar os laços de confiança e relaxar. Afinal, que mal poderia acontecer? Nenhum, pois foram tão gentis. Bjorn e Louise se empolgam com a ideia e viajam com sua filha. São bem recebidos inicialmente, porém hábitos e comportamentos estranhos da família Holandesa começam a provocar incômodos. Por mais flexível e educada que a família Dinamarquesa fosse, a viagem se torna um pesadelo.







Assim como o remake Americano protagonizado por James McAvoy e Mackenzie Davis em 2024, Não fale o mal é um excelente filme que ultrapassa os limites do horror e mostra a cruel natureza comportamental do ser humano. Na sua profundidade, é uma narrativa que diz muito sobre o perigo que pode vir daquela pessoa ou local inesperados, logo, ninguém é integralmente confiável. O suspense vai revelando comportamentos inconvenientes de Patrick e Karin que, se forem vistos na vida real, também causariam constrangimentos e espantos e, no mínimo, um cuidado e atenção maior na aproximação. De fato,  tais incômodos acontecem em menor ou maior grau, inclusive com o aumento crescente da violência, banalização da vida e relações frágeis e fraturadas. Um exemplo disso é a constatação de que muitos assassinos tinham proximidade ou a confiança das vítimas.












À medida que a família Dinamarquesa convive com os holandeses, as interações vão ficando bizarras e insustentáveis. O que eles não esperavam era o grau de violência que estavam lidando ao passar uma temporada com pessoas severamente perigosas, ou seja, criminosos com alto nível de psicopatia. Excêntricos e frios, o casal Patrick e Karin conseguem ser mais cruéis do que o casal protagonizado por James Macvoy e Aisling Franciosi, exatamente por serem mais quietos e misteriosos.












Nessa característica está uma das diferenças  da narrativa: a versão Dinamarquesa não perde a abordagem fria e crua, em contínuo suspense e mistério nas interações das personalidades em questão. Enquanto o remake Americano tem uma narrativa que insere uma melhor conexão afetiva com os personagens visando atender uma perspectiva mais "blockbusteriana" de entretenimento, o filme de Christian Tafdrup vai direto ao ponto com relações mais distantes, cínicas e econômicas, com um terror psicológico mais entremeado nos silêncios e poucos diálogos e ações das famílias e utilizando menos o protagonismo das crianças em comparação ao filme de 2024.





Essa diferença na experiência com o filme não é apenas uma questão cultural, mas está relacionada a uma escolha de roteiro e direção ao usar o personagem de James MacVoy, que é bastante conhecido pela intensidade e entrega a papéis perturbadores. Hollywood optou por unir o útil ao agradável e ambas as versões se aproximam mas projetam ações diferentes. No caso de Fedja van Huêt, a sua violência está evidente, mas ainda contida e calculista, sendo ele capaz de surpreender a audiência com um nível altíssimo de psicopatia. Com isso, a versão original tem menos ação física, o que o torna mais inquietante, mas não menos cruel considerando que a ação mais impactante é o final.





Tendo em vista seu desfecho, esse longa é um soco no estômago. Aquelas cenas finais que ficam na mente por dias. Traz consternação diante da trágica ocorrência e também compaixão pela família Dinamarquesa. É como aquele corte abrupto, gelado e impiedoso dado no final de uma história que o espectador tem vontade de dizer: "Parem com isso! Não o façam!" Mas que infelizmente, demonstra que a crueldade humana isola e silencia as vítimas.






0 comments:

Caro (a) leitor(a)

Obrigada pelo seu interesse em comentar no MaDame Lumiére. Sua participação é muito importante para trocarmos percepções e opiniões sobre a fascinante Sétima Arte.

Madame Lumière é um blog engajado e democrático, logo você é livre para elogiar ou criticar o filme assim como qualquer comentário dentro do assunto cinema e audiovisual.

No entanto, não serão aprovadas mensagens que insultem, difamem ou desrespeitem a autora do blog assim como qualquer ataque pessoal ofensivo a leitores do blog e suas opiniões. Também não serão aceitos comentários com propósitos propagandistas, obscenos, persecutórios, racistas, etc.

Caso não concorde com a opinião cinéfila de alguém, saiba como respondê-la educadamente, de forma a todos aprenderem juntos com esta magnífica arte. Opiniões distintas são bem vindas e enriquecem a discussão.

Saudações cinéfilas,

Cristiane Costa, MaDame Lumière

Pesquisar este blog

Críticas mais visitadas (Última semana)