Sou MaDame Lumière. Cinema é o meu Luxo.

Por  Cristiane Costa ,  Editora e blogueira crítica de Cinema, e specialista em Comunicação Inspirado pelo best-seller de Robert See...

A Tabacaria (The Tobacconist, 2018)



Por Cristiane Costa,  Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação


Inspirado pelo best-seller de Robert Seethaler, A Tabacaria (Der Trafikant/ The Tobacconist, 2018), o realizador Austríaco Nikolaus Leytner adaptou para a tela grande esta obra sobre o amadurecimento de um jovem e as perdas humanas, sejam elas físicas, materiais e afetivas, ocorridas em um período sombrio da História europeia. O longa foi um dos últimos trabalhos do saudoso Bruno Ganz que interpreta brevemente Sigmund Freud; tempo suficiente para apreciar sua crível interpretação, principalmente sob a perspectiva física do famoso mestre da  Psicanálise.





Ambientado em Viena em 1937, a história conta a jornada de vivências e descobertas de Franz Huchel (Simon Morzé), de 17 anos. Ele parte de seu lar bucólico às margens do Lago Attersee e começa a trabalhar em uma Tabacaria. Na capital Austríaca se dão relações de afeto e um amadurecimento intenso, mesmo em meio ao horror com a chegada dos Nazistas. Este contraponto ocorre com os três tipos de relações interpessoais que Franz desenvolve: o trabalho como aprendiz na tabacaria de Otto Trsnjek  (Johannes Krisch) no qual vê uma figura paterna, a paixão por Anezka (Emma Drugonova) e a amizade com Sigmund Freud (Bruno Ganz).



Em um contexto de pré-guerra, o roteiro segue uma linha dramática menos óbvia ao contar  o ponto de vista de Franz. É uma escolha interessante. O jovem traz certa pureza, romantismo e a possibilidade de esperança ao ambiente. Dessa maneira, a guerra não está em primeiro plano, mas está presente com a aproximação das tropas nazistas, trazendo tensão e incerteza, de forma mais contida. Ao mostrar como Franz lida com esses afetos e perdas, partindo em caracterizar um belo, corajoso e esforçado jovem, a história tem a potência de mostrar como a guerra afeta as subjetividades e impõe escolhas difíceis. 








A Tabacaria funciona como um microcosmo dos acontecimentos e emoções. É nela que Franz conhece diversas pessoas, aprende a se expressar, a observar o cotidiano, a defender o que acredita e quem ama. É também, através dela, que cada personagem cumpre um papel para o despertar de Franz. Seu dono,  Otto Trsnjek, é um sobrevivente e um libertário. Com uma deficiente física e vítima de preconceito social, ele dirige um núcleo de resistência e está ali a ensinar o ofício ao jovem e a apresentar-lhe as pessoas da região. Essa figura paterna de Otto pode ser interpretada como a importância e a perda de um pai. Com o avanço do Nazismo, esses pais de outras nacionalidades sofrem perseguição como presas de outras formas de pensar e viver que estavam sendo silenciadas.








Com Anezka, Franz tem o desejo pelas paixões. Ela não é bem o primeiro amor, mas é aquela que desperta o desejo pelo amor, ainda que inconsciente. É através dessa paixão que o jovem começa a conversar com Sigmund Freud sobre os sonhos, fato que possibilita uma brecha para inserir um pouco da interpretação dos sonhos sob a perspectiva Freudiana. Franz descobre o corpo e prazeres femininos com ela, o que os tornam um casal que traz o entretenimento das paixões em vários planos. É também um núcleo narrativo interessante pelo coming of age, e um momento muito marcante considerando como as narrativas afetivas se encontram, se entrelaçam e se separam.





Bruno Ganz é um charme e educação à parte e expressa uma postura bem clássica de Freud. Certamente, pela atuação dele, qualquer pessoa adoraria ter uma amizade com o renomado médico e pesquisador Austríaco. Ele se coloca como um amigo de Franz em uma relação de confiança e humildade. Como se trata de ficção inspirada por fatos reais, infelizmente, uma das lacunas do roteiro foi não explorar melhores cenas com Freud. A passagem dele é tênue, gentil e sem muita profundidade, assim, desfrutar de A Tabacaria é não levar à sala de Cinema ou de TV qualquer expectativa que se trata de um filme Freudiano e nem biográfico sobre Freud. A ideia de amizade não deixa de ser válida ainda que Freud poderia ter tido mais espaço como coadjuvante.  


Sob a análise da decupagem e direção em geral, o diretor realizou um bom trabalho. A direção de arte recria um autêntico microcosmo de época e os planos equilibram os sonhos de Franz, alguns bem construídos com memórias do passado e desejos inconscientes, e outros com a realidade de mulheres, artistas e imigrantes na  Áustria, além de outros horrores do período como a  intolerância, o medo e a miséria.








Filme distribuído pela A2 Filmes, disponível nas plataformas digitais de streaming. 

Fotos: uma cortesia @A2 filmes assessoria de imprensa. 




0 comentários:

Caro (a) leitor(a)

Obrigada pelo seu interesse em comentar no MaDame Lumiére. Sua participação é muito importante para trocarmos percepções e opiniões sobre a fascinante Sétima Arte.

Madame Lumière é um blog engajado e democrático, logo você é livre para elogiar ou criticar o filme assim como qualquer comentário dentro do assunto cinema e audiovisual.

No entanto, não serão aprovadas mensagens que insultem, difamem ou desrespeitem a autora do blog assim como qualquer ataque pessoal ofensivo a leitores do blog e suas opiniões. Também não serão aceitos comentários com propósitos propagandistas, obscenos, persecutórios, racistas, etc.

Caso não concorde com a opinião cinéfila de alguém, saiba como respondê-la educadamente, de forma a todos aprenderem juntos com esta magnífica arte. Opiniões distintas são bem vindas e enriquecem a discussão.

Saudações cinéfilas,

Cristiane Costa, MaDame Lumière