Por Cristiane Costa, Editora e blogueira crítica de Cinema, especialista em Comunicação.
Emmanuelle Bercot é uma diretora que gosta de abordar temas polêmicos em seus filmes, característica que é bastante atrativa no seu estilo. Demonstra que ela não foge do enfrentamento e apresenta esperança e um senso de justiça nas histórias. Assim como "De Cabeça Erguida", seu antepenúltimo filme que contava sobre o sistema socioeducativo para jovens delinquentes, com "150 miligramas" (La Fille de Brest) ela retorna à direção para jogar luz na obscuridade da indústria farmacêutica.
Baseado no livro de Irène Franchon, Mediator 150 mg, Bercot aborda os questionamentos acerca deste medicamento, produzido pela farmacêutica Servier e retirado do mercado em 2009. O medicamento prejudicou entre 500 a 2 mil pessoas na França. Era receitado para tratamento de diabéticos com problemas de sobrepeso, depois foi usado como inibidor de apetite. Começou a provocar efeitos colaterais com sobrecarga cardíaca para os pacientes, levando a óbito vários deles.
No papel de Irene está a atriz Dinamarquesa Sidse Babeth Knudsen, conhecida por "Depois do casamento", de Susanne Bier, e quem tem realizado trabalhos na França, mais recentemente "A Corte" de Christian Vicente. Knudse é uma excelente atriz. Aqui ela incorpora um perfil obstinado, carismático e bem humorado, na pele de uma pneumologista do Hospital Universitário de Brest. Irène começa a desconfiar do Mediator, o que dará início a um processo de investigação sobre os males do medicamento.
A decisão pela adaptação para o Cinema partiu da própria autora e produtores, mas Bercot abraçou a causa muito mais pela garra de Irène Franchon, um drama de quem bateu de frente com a indústria pharma, ação bastante heróica, levando em conta que é um dos segmentos industriais mais poderosos do mundo, estratégico, competitivo, lucrativo e lobista por excelência. Além de ser um mercado que provoca reações controversas considerando que todas as pessoas, gostando ou não, colocam fé, se vêem obrigados a confiar ou simplesmente odeiam essa indústria.
A performance de Knudsen mostra que esta não é apenas uma história sobre um escândalo pharma, é parte da biografia de uma mulher que se preocupava com os pacientes e embarcou em um processo exaustivo, de alta exposição pessoal que colocou em xeque se ela era insana, vaidosa ou justa. Por outro lado, é um personagem que não ganha empatia fácil, mesmo com os esforços da atriz que marcou bem a personalidade da especialista. Todas as virtudes da protagonista estão na narrativa: mãe de família, boa esposa, divertida, atenciosa, corajosa, justa. Entretanto, sua obstinação e ego têm um ritmo ligeiro demais, o que dificulta uma conexão mais emocional com a personagem.
Bercot optou por incomodar ao máximo o espectador, começando pelo realismo visceral do ambiente hospitalar, como por exemplo, imagens fortes de corpos em cirurgia ou na necropsia. Outro incomodo é o jeito acelerado da heroína, que pode ter sido uma decisão da diretora ou uma característica biográfica. Assim, Bercot não dá muito tempo para digerir a história, que é confusa e complexa em determinados espaços. É o tipo de roteiro que exige total atenção às reviravoltas, idas e vindas de Irène e de aliados como o personagem de Benoît Magimel. Mesmo que pareça um roteiro de difícil adaptação, em alguns momentos, esta dificuldade é projetada para a experiência com o filme e o prazer é comprometido.
É um bom longa, desafiador na forma como foi roteirizado pela diretora e Séverine Bosschem, mas não supera em qualidade de direção os antecessores como "Meu Rei" e "De Cabeça Erguida". Suas lacunas estão mais em determinadas sequências e desencadeamentos que dificultam o acompanhamento do sentido para a compreensão da história. Não é Bercot em ótima forma, assim o mérito fica mais por conta de Knudsen. Ela interpreta uma heroína que faz refletir sobre a importância das escolhas e ações éticas e os riscos envolvidos.
Ficha técnica do filme IMDB 150 miligramas
Distribuição California filmes
Fotos, uma cortesia California Filmes.
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