Adeus, Minha Rainha, drama histórico Francês dirigido sob a batuta de Benoît Jacquot, traz a mise-en-scene 3 belas atrizes: Diane Kruger como a Rainha Maria Antonieta, Léa Seydoux como a sua leal leitora Sidonie e Virginie Ledoyen como o amor da Rainha, Gabrielle de Polignac. Adaptado do romance homônimo de Chantal Thomas, a história acontece em 1789 em Versalhes e enfoca os tensos bastidores da pré-Revolução Francesa às vésperas da Tomada da Bastilha e da queda do Monarquia de Luis XVI. Muito mais do que um drama, o longa tem uma direção que abusa do suspense e da iminência de que cabeças podem rolar a qualquer momento, incluindo a de Maria Antonieta, além de oferecer ao expectador um novo olhar, o feminino, através da devota criada da Rainha, Sidonie, e dos profundos e discretos sentimentos lésbicos que a Rainha nutre pela Duquesa Gabrielle, emoções que conjuntamente influenciam o desfecho do longa, assim como provocam a curiosidade no público a respeito das relações afetivas que une estas três mulheres.
Através de Sidonie e sua absurda lealdade à Rainha é que o filme se sustenta. Ela é o ponto de vista que guia e que, ao mesmo tempo, coloca a curiosidade na mente do observador! Como em um estado de negação a qualquer custo, ela se recusa a acreditar que a Rainha está na mira dos rebeldes e está disposta a permanecer ao lado de Maria Antonieta nem que tenha que renunciar a sua própria segurança e se colocar em uma posição cada vez mais submissa a favor dos caprichos e instabilidades da monarca. Com a excelente atuação de Léa Seydoux com sua beleza e frescor juvenis, suas olheiras marcantes que ressaltam sua servidão e seu olhar dissimulado e misterioso, a protagonista Sidonie é o grande acerto deste filme. Ao trazer uma leve temática homossexual através do amor e desejo de Maria Antonieta por Gabrielle, a devoção de Sidonie pode ser considerada somente a lealdade de uma serviçal ou pode ser especulada como o potencial desejo de uma jovem pela sua Rainha. Algumas cenas do longa projetam prováveis evidências de um algo a mais nos sentimentos: Sidonie apreciava o toque da Rainha em sua pele, observava as confissões afetivas de Maria Antonieta à Gabrielle, contemplava o belo corpo nu da duquesa e não poupava esforços em abrir mão do orgulho e amor próprios para satisfazer a sua Rainha. Sob esta perspectiva e, considerando a intrigante forma de atuação de Léa Seydoux, que é por si só uma atriz de olhar naturalmente misterioso, Sidonie é a atração principal do filme.
Com uma ótima atuação de Diane Kruger, menos louca, mimada e excêntrica em comparação a outras Marias Antonietas do Cinema, o expectador observa uma Rainha mais vulnerável por um amor lésbico. Neste ponto, Diane fez uma concentrada e elegante interpretação, mais contida no aspecto passional mas perfeitamente verossímil e convincente. O romance homossexual não é concretizado visualmente na tela, mas ele é sugerido e atiça mais a imaginação do público exatamente pelo fato de não ser concebido através do sexo, por isso estes se tornam momentos mais sedutores e de ligeira tensão. A aproximação, pele a pele, se dá mais pelo carinho de amigas como um beijo na mão, um olho no olho ou um abraço intenso. Aqui, o filme se torna mais interessante porque ele oferece à audiência o benefício de imaginar por si mesmo se Maria Antonieta teve um romance tórrido com Gabrielle e se a Rainha era homosssexual por excelência ou bissexual. Ao explorar levemente esses sentimentos da Rainha, o cineasta Benoît criou uma outra dimensão cinematográfica para Maria Antonieta que vai povoar a mente dos curiosos pela história da Monarquia Francesa e pela sexualidade de personalidades icônicas. Como o roteiro não se propõe a criar um dinâmico foco sexual na história, é impossível não ficar com vontade de buscar o íntimo da rainha nas literaturas, assim como quem foi Sidonie e suas reais intenções de inabalável devoção.
Ao ser o filme que abriu o último Festival de Berlim, ter ótimas atrizes, primorosa direção de Arte e bonito figurino, é evidente que era esperado mais deste roteiro para compor um inesquecível drama histórico. O filme escolhe os bastidores de uma pré-revolução, que é a dimensão histórico social, mas não a explora de forma tradicional e plenamente, o que provoca um sentimento de que faltou acontecimentos catalisadores no filme. O longa somente gera o contexto e a tensão para enfocar as personagens femininas, suas emoções e escolhas. Se por um lado, tal escolha faz com que questões mais históricas não sejam exploradas, como por exemplo, a rebeldia de uma Revolução, suas ações e desdobramentos, por outro lado, como Cinema, ele gera um olhar bem mais interessante sob o aspecto inovador: o da criada de uma Rainha e seu dedicado Amor, sem julgamentos, somente a entrega genuína. A personagem feminina de Sidonie é bem construída para conceber esse tipo de olhar e é o fator principal que deve ser considerado para analisar e valorizar este longa. Mesmo em sua aura de mistério, há momentos específicos que evidenciam claramente como Sidonie , mesmo em sua aparente maturidade e força de carater, era muito leal à Rainha. Ela era tão empenhada a ponto de fazer questão de não ser reconhecida e de não acusar as reais facetas políticas e pessoais de sua Rainha, assim como estava ali tão disponível que não buscava um romance ou um homem para satisfazê-la afetivo e sexualmente, nem desenvolver suas amizades com outras criadas e, muito menos, fugir para bem longe . É um filme que fala sobre amor, auto sacrifício e renúncia de uma criada e, portanto, merece seus méritos na compreensão das variadas dimensões do que é o Amor e como ele é capaz de nos exaltar e nos humilhar.
É o amor tem essa capacidade de humilhar e exaltar, né? Esse eu quero ver desde Berlim. O recorte é muito interessante. Gostei da sua crítica que sugere que a realização aproveita bem esse potencial.
ResponderExcluirBjs